polacodabarreirinha

Poesia, música, gracinhas e traquinagens

quinta-feira, julho 31, 2008


CAROS AMIGOS:

Por motivo de viagem - este blog ficará inativo até segunda-feira dia 03/08/2008.

quarta-feira, julho 30, 2008



Vida de Poeta


Até onde vou, todo mundo sabe,

Vou ver se ainda estou na esquina

Antes que essa poesia louca acabe

E eu já não saiba a que ela se destina.


O coração no peito rufa, bate,

Escoiceia e vai ao encontro da rima,

Como um cão que pra própria cauda late,

E dá voltas, e, em círculos, gira.


Talvez esse lirismo que me invade

E me leva a escrever linha após linha

Seja só ego e o cúmulo da vaidade.


Pode ser também apenas a idade,

Lindezas que o tempo na gente inspira

Depois de tanta espera na fila!


Antonio Thadeu Wojciechowski






Poema ao Infinito

Dos meus olhos partem visões, é hora
E a vida, na válvula de sua vulva,
Flutua no cadafalso da dúvida
E não me dá a poesia de agora.

Sempre e sempre essa pressa ininterrupta
E o céu insiste em ficar do lado de fora.
Deixei para trás a aura da aurora
E lavei a alma na água da chuva,

Mas, Caim, caí mais uma vez na lama
E, cortando a língua de babel,
Compreendi a razão de quem ama.

Nenhuma palavra sob este véu,
A sabedoria da pele é prece
Ao infinito amor que o mundo merece!


Antonio Thadeu Wojciechowski





Universo em corpo e alma.


Sempre e sempre, minha poesia,

A eternidade não passa de um dia.

Quando o sol afinal perder seu posto

Não haverá nem sombra do meu rosto.


A este céu, que queima meus miolos,

Devo o refúgio para meus olhos,

Mas se, por acaso, olho pra dentro,

Já não há mais a questão do tempo,


Pois o tempo, em pessoa, alma do espaço,

Vem comigo, imóvel, passo a passo,

Em cada palavra ou mínimo gesto.


Assim me vejo inteiro neste verso,

E neste verso, brilho de um único astro,

Vejo a vida expandindo o universo!



Thadeu W






terça-feira, julho 29, 2008



senhorinha não-me-toque


“Era tentação, nem menos nem mais”

Edgard Allan Poe


sempre fui inocente, puro e bom
porco chauvinista é o caralho
chegar em você deu o maior trabalho
o teu drama era a cor do batom

tive sempre a melhor das intenções
uma mina assim merece um malho
dama é carta do meu baralho
eu sou como eu sou: um em milhões

não sei a hora de dizer palavrões
minha língua nem a mama segura
viu, ana marta gouveia de bulhões?

diante de um anjo de tal candura
como posso manter minh’alma pura?
fico a pensar com meus culhões



thadeu wojciechowski, edílson del grossi,
marcos prado e roberto prado





buraco branco


espaço tempo é uma cama elástica

a luz desvia da matéria e segue

matéria-prima para as artes plásticas

vamos imaginar que o olho não cegue

e todas as formas ganhem corpo

átomos vivos se expandindo a torto

e a direito, até o descanso final

repouso absoluto, a síntese fatal!



Thadeu W






a primeira cicatriz
a gente nunca esquece


ponha um band-aid no buraco da bala
e pare de se fazer de vítima
perdeu uma perna use a outra

e vê se te manca


justiça de cego é olho por olho
e de banguela dente por dente

nem tudo que vi acreditei

nem todo crime depende da lei

procure a felicidade perdida num tiro certo
e prove que você é um alvo esperto


(thadeu, marcos prado, cobaia, edson e edilson)




rabo de galo, napalm na mão!


acordei pelado num quarto de hotel

depois de misturar todas

no mesmo coquetel

o espelho de batom dizia tchau


entrei no elevador cheio de sangue

vi tudo revirado no hall

pior quando saí pela rua

sol sol sol



Sérgio Viralobos, Thadeu W, Walmor Góes

e Rodrigo Barros





Um dos meus mais belos poemas. Minha filha, Paola,
formanda de Direito,
faz 22 anos e prepara uma festa
com todos os amigos.

Essa eu não perco de jeito nenhum.


Thadeu W





Todo mundo lá, homenageando esse monstro da guitarra.
Um dos maiores gênios musicais nascidos à sombra das araucárias.

segunda-feira, julho 28, 2008



Hitler na Mídia.

Hitler pegava criancinhas no colo
Hitler falava na igualdade da democracia
Hitler sorria para mamães e papais


Hitler sonhou um dia ser prefeito de Curitiba
Porque aqui tem gente
que se acha uma raça superior



Thadeu W





Biranights no Rio


Depois de 28 anos de casados
Descobri que ela não me amava
Como eu a amava mais que à vida
Já não conseguia conviver nem comigo mesmo
Por isso embarquei para o Rio de Janeiro
Por acaso, faltava uma semana para o carnaval

Hoje moro a 100 m de Copacabana
Toda minha tristeza morreu na praia


Thadeu W e Édson de Vulcanis



Remanescentes da folia


Agora que já sou quase sessentão

Em plena idade do lobo espumante

Gelado, seco, suave ou frisante

Borbulho de amor por você


Thadeu e Edson






Bombeando, atarantado

Um grande amor não é fácil de achar
Passei a vida a procurar

Acabei me perdendo também

Chegando ao fim eu fui além

Tontas disseram que me amavam

Que lá pelas tantas saí do sério

No corpo a corpo, elas se fartaram

O amor é o único mistério


Ó meu amor, que eu nunca vi na vida,

Infarto miocárdico foi festa despedida!



Thadeu e Magoo





Narciso de Bunda Suja


Nasceu velho e sem pudor nenhum

Exibicionista que nunca se enxergou

Amigo público nº 1 de si mesmo

Mas morreu sem rir da última piada, triste,

Com todo o peso da irresponsabilidade


Thadeu, Édson, Capetão




sexta-feira, julho 25, 2008

Gertrudes, a enfermeira do Torcedor.


Bola Perdida

“A televisão é maior maravilha da ciência a serviço da imbecilidade humana.”


Meus especialíssimos leitores, a vida é tão retumbante que, muita vez, sinto vontade de sair por aí tocando bumbo, só para não tocar o foda-se. Explico melhor. A realidade não é só aparência. Esta, vocês sabem, engana. E ilude. Nem lembro porque estou falando isso... Ah, lembrei. Não sei se já disse a vocês que a universidade é o local onde a ignorância é elevada a sua máxima potência e levada as suas últimas conseqüências. Bem, se não disse, está dito. E já completo. O que eu quero mesmo lhes dizer é que, atualmente, espalham-se, como vírus em computador, as faculdades por ensino à distância, via televisão ou internet. Ou seja: o que já era ruim virou o mais cínico e deslavado engodo educacional. Um crime. Uma farsa. Onde o aluno finge que aprende e o professor faz de conta que ensina. E ambos se locupletam, um pela lomba e outro pela grana. Mas isso não tem importância.


OS FALACIANOS NÃO SABEM QUE A BAZÓFIA

É UM ESTADO DE ESPÍRITO DE PORCO.


- Quanta merda, quanto disparate, quanto desvario, quanto desatino! Ó escriba farisaico, quantos “quantos” ainda haveremos de proferir até que em sua cabecinha entre a verdade, final e absoluta, que você é, apenas e simplesmente, um redator de uma coluna cujo assunto foi, é e será para sempre o futebol? Será, minha mula burra, que você não percebe que não dá pra continuar enganando seus equivocadíssimos leitores? Toda sexta é aquele mesmo blá-blá-blá: “mas isso não tem importância” “mas o que eu quero mesmo lhes dizer”. Uma pobreza de estilo sem precedentes na história universal. Você, Dalton, é pobre de dar dó. Pobre de espírito, pobre de idéias, pobre coitado. Olhe pra você, escriba do satanás, olhe pra esse terno ensebado, olhe pra essa gravata puída, olhe pra esse colarinho encardido, olhe pra esses sapatos caindo aos pedaços... E você aí, com essa pose de santo barroco franciscano. Vai cagar no mato, vai, ô mosca de cavalo!

- Essa eu gostei, Geraldo! Ahahahaha... A gente tá ficando fera em xingar esse porco lazarento. Qualquer dia você mata o cara com um desses discursos. Ahahahaha...

- Mas a intenção é essa mesma, Ribamar. Quero ver esse idiota letrado estrebuchar na minha frente. Ahahahahaha...


- A gente podia era esfaquear o cérebro desse cancro sifilítico.


- Tá louco, Riba! Ia vazar tanta merda, mas tanta merda...

- Ihhh... nem fale. Ahahahaha... Já tô sentindo a catinga.


- É a modorra do terninho, da camisinha, da gravatinha e dos sapatinhos que já estão em adiantado estado de putrefação... Ahahahahahaha....


- Ahahahahahaha... Vamos fumar e respirar ar puro, que aí aqui tá foda o troço.


Os dois, de braços dados, rindo de minha cara, saem para fumar. Confesso, meus solidaríssimos leitores, não sei o que fiz para merecer toda essa pusilaminidade. Mas, como já lhes disse, não os odeio e nem lhes tenho amor também. O Geraldo, vocês sabem, fornica com a própria alma. É um atentado permanente contra si mesmo. A manutenção de sua integridade física é um desses fenômenos paranormais que, de tão inexplicáveis, melhor nem comentar. Ele está à minha direita e sua maior obstinação é se apoderar de minhas rocambolescas frases e tiradas. Aliás, acho que toda a sua vida é um plágio, um grande, cínico e deslavado plágio. Mas isso não tem importância. O que eu quero mesmo lhes dizer é que o caso do Ribamar é bem mais sério do que pensei há 10 anos, quando ele foi contratado. Na verdade, tudo começou há 8 anos, quando observei os primeiros pêlos crescendo em suas mãos. Em seguida, mês a mês, espinhas em uma quantidade incalculável foram aparecendo na mesma medida que o seu rosto naufragava em meio a esse turbilhão inquestionável de pus e sebo. Hoje em dia, confesso, me dá uma alegria enorme, vez em quando, vislumbrar o seu rosto em meio a essa massa disforme e decrépita que habita o seu semblante. O Ribamar, não sei se já lhes contei, há dois meses completou 22 anos. E é apontado pelo Guiness como o mais velho office boy do planeta. É nosso office old. Esses dias, o nosso diretor, o Dr. Horácio Penaleve, deu-lhe uma placa por seus 10 anos de leva e traz e, em discurso inflamado, disse, em alto e bom tom, que contava com ele por mais 10 anos nesta função e foi aplaudido de pé por toda a redação. Mas isso não tem importância.



SE O OLHO É A JANELA DA ALMA,
A BOCA É A PORTA DO CORAÇÃO.


O que eu queria mesmo lhes dizer é que todo esse chiste, essa pilhéria, essa bazófia, não me perturbam o espírito. Sim, eu sei, sofro as mais cavas humilhações por ser pobre e, principalmente, por não ver a menor possibilidade de reverter essa condição de inadimplente até na hora de pagar promessas. Não sei se já lhes contei que sou perseguido por cobradores desde os 7 anos, quando comprei fiado meu primeiro sonho de nata na bodega do seu Nicanor. Sim, desde os 7 anos sofro as mais cavas e profundas humilhações... Minto e já me corrijo. Não foi aos sete anos e, sim, aos seis. E também não era um sonho e, sim, uma malemolente e sensual maria-mole. Assim como também não era a bodega do seu Nicanor, mas o insubstituível armazém do seu Boleslau.
De lá para cá, não fosse a graninha do trabalho, como diarista, de Dona Zenóbia, minha doce esposa, provavelmente, eu estaria soterrado por uma avalanche de notas promissórias e cheques pré-datados. Mas não é isso o que eu queria lhes dizer e, sim, que a justiça brasileira é muito eficiente em dois momentos: na hora de chutar o cu dos pobres, mandando-os para a prisão, e no momento de absolver os ricos. Qualquer milionariozinho de bosta é capaz de, com alguns milhares de dólares, comprar as mais excêntricas sentenças, criando jurisprudências inomináveis. Eu, assim como vocês, meus injustiçadíssimos leitores, não quero ser dono da verdade e, sim, sócio, mas não uma sociedade anônima. E também não quero uma cota pequena, não. Quero, no mínimo, continuar a gerenciar minha loucura, orgulhosamente. A humildade, vocês estão carecas de saber, é tão efêmera e estranha que, no momento em que achamos que a temos, já, a perdemos. Muita vez, para sempre. Se bem que só o certo é para sempre. E o certo está escrito, com todas as provas, nos olhos e na voz daqueles amam de verdade. Mas isso não tem importância.


O VAMPIRO CHUPACABROU A LÓGICA.


O Trevisan chegou à noitinha lá em casa e, esganado, foi logo pulando sobre a travessa de broinhas de fubá mimoso e, voluptuoso, entornou o litro de licor de ovos. Fico assistindo, em silêncio, durante 20 minutos, dentes despedaçando broinhas e farelos espalhados por toda a varanda ou empurrados goela a dentro por sonoras talagadas. De bucho cheio até o gorgomilo, Trevisan descasca: .

- Fui ao hospital hoje.


- Eu fui ontem.

- Então diga pra mim, primeiro, o que aconteceu.

- Nada. Cheguei lá e ele estava com a cabeça coberta. Falei, falei e ele não fez nem um muxoxo. Depois de duas horas, desisti.


- Comigo foi diferente. Escute só. Cheguei no hospital, entrei no quarto sem bater e dei de cara como uma cena que você não vai acreditar.

- Vindo de você, eu acredito até na minha sogra.


- Então, saca. Entro e a Gertrudes, aquela enfermeira boazuda, estava fazendo uma chupeta no Torcedor.

- Ahahahahahaha... Não acredito nisso!


- Bote fé. Quando os dois se dão conta, eu já estou no meio do quarto.

- Puta que o pariu. E daí?

- E daí, cara, ficamos os três se olhando, completamente imóveis, durante uma eternidade e meia.


- O fato, Trevisan, por favor, só o fato.

- O fato é que o Torcedor levantou e, na maior cara de pau, falou; - “Bem, vamos dar uma mijadinha.” E foi para o banheiro. A Gertrudes, que estava com os peitões de fora, desfilou-os diante de minha boca sedenta, arrumou-os no sutiã e saiu, depressinha, se oferecendo toda.

- Ok. Mas o tio Torcedor?

- Voltou uns 10 minutos depois e disse que tinha passado a mão na cara.

- Como assim?

- Punheta, Dalton! Tocou uma bronha. Descabelou o palhaço. Como você é burro!

- Burro é você, animal. Se ele não estava falando, como você me explica?

- Então escute. Ele falou durante mais de três horas. Só que, na verdade, ele não falava comigo, pois não importava o que eu dissesse, ele continuava a falar consigo mesmo sobre a sua dupla personalidade. Súbito, mais sério que padre quando casa, levantou-se, foi até o espelho, cumprimentou-se e disse, afetuosamente: - “Até mais, meu velho! Foi um grande prazer dividir este espaço e esta prosa com tão magnânimo e beatífico ser. Sinto que seremos amigos para sempre.”
Falou, deitou na cama, cobriu a cabeça e desembestou a roncar, quase instantaneamente.


- Que loucura! Futebol, que é bom, nada?

- Nem uma sílaba.


- Estranho. Muito estranho. Mas vamos falar de coisas mais normais. Pegou a mensagem do Machado de Assis no terreiro do Pai Véio Chico Fantasma?

- Não deu. Eu bem que queria ir, mas tua mãe ameaçou morder meu bigolingo, caso eu tirasse de sua boca.


- Vai tomar bem no meio do olho do seu cu. Pegou ou não pegou?


- Claro, né, estúpido. Tá aqui, ó. O Véio disse que é pra você abrir, logo após a meia-noite, assim que piar a coruja. Fez sérias recomendações, disse que com o Além não se brinca.

- Sabe, Trevisan, eu acho que o Pai Véio...
O desgracido sai e não diz nem tchau, deixando um silêncio ensurdecedor à minha volta. Fico a pensar com meus botões de futebol de mesa e, pensando, meus olhos se voltam para cima. O céu agora é de um azul profundo e imenso. Meteoros kamikazes passam e deixam em luz sua última mensagem. Tudo é tão infinitamente pequeno, vago, etéreo. Deixo minha mente vagar, e de vagar em vagar, devagar e sempre vou me misturando com as estrelas, quasares, pulsares e sinto o universo inteiro pulsar em meu pulso. E sinto tanto que nesse enlevo, como por encanto, de quando em quando, astros me pisam, distraídos. Mas, de repente, não mais do que de repente, soa a primeira das doze badaladas que vão acabar o dia e começar um outro. Abro os ouvidos e perscruto as redondezas. Foi-se a segunda, a terceira... as doze badaladas soam uma após outra, até o silêncio gritar madrugada a dentro. Pego o envelope nas mãos e, trêmulo, espero piar a autorização. A noite é enorme e densa e, no peito, meu coração é um potro xucro escoiceando a jaula.
Mas isso não tem importância.



O ROBERTO PRADO É UMA BESTA!



O que eu queria mesmo lhes dizer é que o Beco me ligou ontem às 4h47 da madruga e, na pressa de atender, quase esparramo pelo chão a Dona Zenóbia que, como eu, dormia profundamente.

- Alô, Roberto?

- Como você adivinhou que era eu?

- Palpite.

- Então jogue na loteria que você ganha.

- Menos, Beco. É que havia uma chance em 6 bilhões de que fosse outra pessoa.

- Ainda bem que você não estava dormindo.

- Imagine! Eu e Dona Zenóbia estamos dançando uma polca punk no último volume. Até tem uns caras com umas tochas acesas aí na frente de casa. É agora que o troço vai começar a esquentar.


- Ah que bom. Eu fico feliz por vocês. Mas me diga uma coisa, Dalton. Não é verdade que só os idiotas não se contradizem?

Quase caio duro, seco e arreganhado, mas com um esgar e a voz amarfanhada, arrisco:

- Sem dúvida, Beco.


- O povo é um débil mental. Digo isso sem nenhuma crueldade. Foi sempre assim e assim será, eternamente.

Fulminado e sofrendo arrancos fenomenais que mais parecem convulsões da alma, amenizo:

- Verdade, Beco, a grande maioria vive de certezas absolutamente incríveis, com base no comprar e no imitar. A materialidade do mundo se incorporou na humanidade de tal maneira que engessou a alma do povo diante de um aparelho de TV.

- O diabo pode até citar as Escrituras e pregar os 10 mandamentos quando isso lhe convém, não é verdade?


Engulo em seco 3 ou 4 recôncavos baianos, mas suando frio e com a língua quase presa, resmungo:

- Prode terr celteza, Beeco. Mmas bocê não acha que... A besta desliga, me deixa falando sozinho com meus botões e não me deseja nem bom-dia. Mas isso não tem importância.


UMA FLOR DE OBSESSÃO.



O que eu queria mesmo lhes dizer é que adoro ver o sol nascer. E começar bem o dia. Nada como um café bem quente e um cigarrinho logo depois para retemperar o espírito. É nesses momentos que deixo a imaginação voar e ir ao encontro de tudo que me faz feliz. Não sei bem o motivo, mas me ocorreu agora que, em 1978, minto, 1976, em uma noite de setembro - sim, o cheiro das flores no ar era todo primavera – eu e Nelson Rodrigues caminhávamos sem destino à beira da praia de Copacabana. A noite morna e a brisa fresca faziam uma combinação tão perfeita que milhares de pessoas, por toda orla, se sentiram convidados a sair de casa e passear. As ondas empurradas pela preguiça do vento chegavam à praia quase desmaiadas, quase sem espuma, quase sem som. Apenas conversas aqui e ali, risadas acolá, se espalhavam alegres pelo ar e nos davam a sensação de que o mundo é bom e viver a vida vale à pena. Nelson, a certa altura, tocou em meu ombro e, com o queixo, indicou-me a mesa vazia na calçada. Não lembro mais o nome do bar... Ah...lembrei! Bar da Ponta, isso mesmo, Bar da Ponta. Sentamos e um desfile interminável de belas garotas encheu nossos olhos. Vejam bem, meus voyeuríssimos leitores, uma mini-saia é o mesmo que uma cerca de arame farpado, pois cerca a propriedade, mas não tapa a visão. Mas isso não tem importância. O que vale é que eu e Nelson estávamos que estávamos. Ríamos de tudo e pra todos. Mas sem mais nem menos, súbito, Nelson fica taciturno e com os olhos turvados, desembesta:

- Há alguns dias, um amigo me parou na rua e, mais efusivo que capacho de patrão, entregou-me um exemplar de uma revista: -“Toma isso aqui e lê. É o Brasil.” Tentei dizer alguma coisa, mas, célere, ele já partia. Olho a revista e tomo um susto. Lá estava escrito Meu Bebê. Não entendi nada. Pensei: -“Que piada é essa?” Na capa, estava uma cara, em cores, de um bebê lindo. E eu continuava a não perceber que relação podia eu ter com uma revista chamada Meu Bebê. Fosse como fosse, levei aquilo pra casa. E, depois do jantar, fui apanhar a revista. Comecei com uma curiosidade muito rala e fui tomado, em seguida, de um interesse total. Sempre digo que a leitura é uma arte da releitura. Depois de ler, fui reler. E o meu espanto era cada vez mais profundo.
Antes, porém, de falar de Meu Bebê, Dalton, quero dizer duas palavras. Há pouco tempo, um colégio grã-finíssimo, de São Paulo, convocou os pais. Quase me esquecia de especificar que era um colégio dessas freiras “pra frente”. Simplesmente, a Madre queria comunicar que a Educação Sexual, naquele educandário, ia começar no jardim-de-infância. E dizia a religiosa: -“O sexo não tem mistério nenhum. Nenhum, nenhum.” E, portanto, meninos e meninas a partir de quatro anos iam ser esclarecidos sobre a atividade sexual. Não houve espanto, absolutamente. Os pais e mães ali presentes eram espíritos altamente compreensivos. A única dúvida era a seguinte: - como meninos e meninas, que não sabiam ler, nem escrever, nem assimilar, poderiam entender as aulas? E, então, risonhamente, a Madre explicou: - “Vão aprender com figurinhas.” Os presentes se entreolharam, maravilhados. Um senhor disse e repetiu: -“Interessante, muito interessante!” E, súbito, uma senhora ergueu-se. De pé, batia palmas. Logo outros, também de pé, aplaudiam, em delírio. A ninguém ocorreu que os garotinhos e garotinhas iam aprender com figurinhas o que a Polícia toma de certos jornaleiros e ainda os processa. Estavam ali pais, avós, tias, etc., etc. E todos ovacionando como na ópera. A Madre teve um sucesso de final de ato. Só faltou receber corbeilles, etc., etc. Umas das raras colunas da imprensa brasileira e internacional que ainda se espantam é a minha, Dalton. Todas as outras são divinamente compreensivas. Mas como ia dizendo, minha coluna pôs a boca no mundo. Não sei se você se lembra do que escrevi, mas eu lhe conto tudo. Dar “Educação Sexual” a menininhas de 4 anos já me parecia um escândalo. E, ainda mais, com figurinhas obscenas, dessas que alguns jornaleiros vendem, às escondidas, aos sátiros gagás. Disse eu, na ocasião, que a “Educação Sexual” é uma das mais deslavadas e cínicas imposturas do nosso tempo. Afirma o Raul Brandão, pintor de igrejas e de grã-finas: -“Sexo, e apenas Sexo, é coisa para bezerros, bodes, preás e jumentos”. No homem, Sexo é amor. Portanto, só se entenderia, não uma “Educação Sexual”, mas uma educação para o amor, etc., etc. Mas lendo Meu Bebê, verifico como foi ingênuo meu espanto. Afinal, o tal colégio grã-fino de São Paulo, embora usando figurinhas obscenas, lidava com meninos e meninas de 4 anos. Já a revista que ganhei de presente voa mais alto. Meu Bebê, como próprio título diz, trata de bebês. Você já imaginou, Dalton, a Educação Sexual começando no berçário? Visualize a cena – a criança que não provou ainda sua primeira chupeta aprendendo coisas que até a Paulina Bonaparte ignorava. Se a Messalina, aos 70 anos, lesse essa revista de bebês, havia de fazer esta autocrítica sucinta e lapidar: - “Eu sou uma analfabeta. Uma analfabeta sexual.”

Rimos de estufar a veia do pescoço. E, logo depois nos despedíamos. Nos abraçamos, forte, afetuosamente e, sob a luz das estrelas, caminhamos um para cada lado. Mas isso não tem importância.


TORCER É UMA ARTE NOBRE,

NÃO UMA ARTE MARCIAL.


O que eu queria mesmo lhes dizer é que o campeonato é por pontos corridos e vai que é um upa. Domingo passado, o Coritiba foi a Belo Horizonte e voltou com as calças arriadas. Perdeu de 3x2 para o Atlético Mineiro, depois de sair em vantagem e marcar dois gols em 18 minutos. Achou que o jogo estava ganho. Bastou o Gallo colocar o Petkovic em campo para o time desmontar. E desmontar mesmo, pois Rubens Cardoso e Marlos foram expulsos. Tomou 3 gols e poderia ter tomado mais. O Dorival, cara de pau, teve que fazer milagres para colocar o time em campo contra o bom time do Ipatinga ontem. Que joguinho nervoso! O Coritiba parecia o exército persa, de Xerxes, contra os 300 de Esparta. Bateu, bateu, bateu. E furou a excelente retranca armada pelo técnico Ricardo Drubscky. Furou não é a palavra certa. E já me corrijo. Depois do escanteio, a bola era rebatida e voltava para os pés coxas, até que caiu nos pés de quem conhece tudo. Paraíba recebeu e, como um verdadeiro ilusionista, lançou no vazio para si mesmo, driblando o zagueiro e deu um toque na bola que, maravilhada, como se tivesse asas, desviou da multidão ipatinguense que estava à sua frente e foi se alojar no canto direito superior para premiar o craque. Muitos torcedores, nesse momento, foram até a bilheteria e pagaram novamente o ingresso. O Maringas me mandou uma mensagem no celular dizendo que havia uma fila enorme e que continuava a crescer mesmo após o término do jogo. Mas isso não tem importância. Sábado, tem mais. O Coxa pega o Náutico, no Aflitos, às 18h20 e, na quinta, o Grêmio, no Couto Pereira, às 20h30. A torcida que nunca abandona deve estar mais aflita do que nunca, pois até agora o time alviverde só conseguiu 3 empates fora de casa e perdeu o resto. O Dorival, cara de bacalhau, deve estar preocupado, mas vai contar com a volta de alguns titulares. Vamos ver se o time tira o pijama. Já, na quinta, o caldo engrossa um pouco mais. Vem aí o Grêmio que está lá em cima na tabela. É a hora e a vez da torcida fazer valer o mando de campo. E a torcida coxa faz mesmo. E faz bonito.


O Atlético pegou o Vasco e fez o time do Dinamite virar um peido de velha. Jogou como se deve jogar, com alma, coração e raça. Dominou como quis o Vasco e poderia ter goleado. Isso dito assim, pode parecer exagero. E é mesmo, um cínico e deslavado exagero. Na verdade, não foi tão fácil assim. Pois aos 36 minutos do segundo tempo, quando o Atlético vencia por 2x1, o Vasco teve um pênalti a seu favor e, se marcasse empataria e a história do jogo poderia ser outra. Mas Gallato estava lá e, numa belíssima defesa, fez explodir de alegria o coração de cerca de 20.000 fanáticos. Um espetáculo, a defesa foi mais comemorada que o terceiro gol. Destaque também para a contundente jogada de Ferreira que deu origem ao segundo gol. No jogo de ontem em Recife, o Atlético só entrou em campo aos 25 minutos do segundo tempo, mas já tinha perdido para o Sport de 1x0. Mas isso não tem importância. Domingo tem mais. O Atlético pega em casa o Figueirense, às 16h00 e o Vitória, na quarta, no Barradão, às 19h30. Duas pedreiras, mas em casa a torcida inflama o time e faz todo mundo jogar que nem homem. Mas o Figueirense não é de se matar com a unha e sempre joga bem fora de casa. Todo cuidado é pouco. Quanto ao Vitória, a torcida do furacão vai ter que fazer macumba, com galinha preta, vela e cachaça, pois enfrentar o time baiano no Barradão é uma barra pesada. O Vitória tem despachado seus adversários e já é a grande surpresa do campeonato. O Atlético, fora de casa, tem tido um desempenho pífio, inconstante, alternando bons e maus jogos. Mas futebol é uma caixinha de surpresa.

O Paraná é só alegria, no momento. Venceu o Brasiliense, na Boca do Jacaré e o Barueri em casa. Com os 6 pontos, subiu na tabela e afastou-se da zona de rebaixamento. O time está mais consistente na defesa e o meio-de-campo, o ponto alto da equipe, tem criado muitas oportunidades mas o ataque ainda está devendo. Sábado, na Vila Capanema, pega o líder Corinthians, às 16 horas. Um pega imperdível. Assim como o ataque tricolor, a torcida também está devendo. Eis aí uma boa oportunidade para lotar a Vila e galgar mais algumas posições. A Fiel, podem ter certeza, vai estar lá e em bom número. Mas isso não tem importância.


DONA ZENÓBIA É UMA SANTA!
UMA SANTA!



O que eu queria mesmo lhes dizer é que Dona Zenóbia e eu não gostamos de televisão. Raramente, a ligamos para ver um noticiário ou um jogo de futebol. Gostamos muito é de ler e quase não nos sobra tempo para mais nada. Dona Zenóbia é de um ânimo realmente incrível, pois, apesar de trabalhar duramente o dia inteiro, após o jantar, ainda tem forças para sentar-se ao meu lado na varanda e ler um bom livro até chegar o sono. Faz isso sempre. E comentamos e lemos juntos alguns trechos. E, confesso, isso dá um toque todo especial para o nosso relacionamento. Às vezes me entristeço, por não ter podido custear seus estudos de Direito. Ela, com certeza, seria uma juíza (esse era o seu sonho) brilhante e, ponho minha mão no fogo, saberia fazer justiça. Seria incorruptível como o mais puro pergaminho. Mas isso não tem importância.

O que não posso deixar de lhes dizer é que anteontem, quando a coruja piou, abri o envelope que o Pai Véio Chico Fantasma me enviou, através do Trevisan. Ao retirar a mensagem de dentro do envelope, senti nas mãos a leve textura do papel e essa agradável sensação táctil contagiou-me todo o espírito. No papel branco e liso, a letra de Machado de Assis, simples e elegante, deu à mensagem a diagramação de um mestre na arte. Com toda a alma concentrada, leio: “Dalton, a primeira condição imposta a quem escreve é não aborrecer quem vai ler. Pense nisso com carinho. Assinado Machado de Assis.” Confesso a vocês, meus oportuníssimos leitores, a mensagem atingiu-me em cheio. E, na minha dispnéia emocional, já estou dizendo pra mim mesmo: -“Você abusa. Você abusa.” No mesmo instante desfilam diante de mim minhas metáforas, meu doce estilo novo, meus textos. E perguntei-me: -“Quem é o Dalton? Quem é o Machado? Quem é o Rodrigues?” Geralmente cada qual é um só. Cristo foi Cristo, exclusivamente Cristo e tão somente Cristo, do berço ao túmulo e dali para o Céu. E assim Nero, Maomé, Augusto dos Anjos, Leminski, Marcos Prado ou Guimarães Rosa. Mas no meu caso, será que eu sou eu mesmo? E se eu não for, o que será de mim? Escrever-se. Escrever a si mesmo. Qual será meu texto, afinal? Minha vida? Respondam-me ou calem-se para sempre, meus participativíssimos leitores. O certo é que mais uma semana se foi e julho está com os dias contados. O mês de cachorro louco vem aí e já sinto vontades de uivar pra lua. Mas isso fica para a próxima sexta. Por enquanto, poupem-me, porque de mim cuida, e muito bem, a Dona Zenóbia, minha doce e deliciosa esposa. Até lá.



Dalton Machado Rodrigues
daltonmrodrigues@gmail.com






quinta-feira, julho 24, 2008


metamorfose


meu papagaio é preto

dorme de ponta cabeça

chupa sangue

fica morcegando o dia inteiro

e, às noitinha, quando sonha,

pensa que é o Batman


Thadeu e Édson




lógica curitibana



não há flores no vaso sanitário do resgate social

curitiba te come belas beiradas

a tônica aqui é o ponto final

no cemitério

se ouve o clamor das frases cortadas



Thadeu






quarta-feira, julho 23, 2008




solidão sideral


daquela estrela até esta outra
a noite é uma camisa de força
em claro adeus à companhia

solidão desta estrela
à solidão daquela lá
tão longe, tão só
cansa até pra falar


Antonio Thadeu Wojciechowski



solitário


Como um fantasma que se refugia

Na solidão da natureza morta

Por trás dos ermos túmulos um dia

Eu fui refugiar-me à tua porta



Fazia frio e o frio que fazia

Não era esse que a carne nos conforta

Cortava assim como em carniçaria

O aço das facas incisivas corta


Mas tu não vieste ver minha desgraça

E eu saí como quem tudo repele

Velho caixão a carregar destroços


Levando apenas na tumbal carcaça

O pergaminho singular da pele

E o chocalho fatídico dos ossos!


Augusto dos Anjos

( 1886-1914)