A VINGANÇA DO POVÃO
Capítulo 4
Te direi com quem ando e me dirás quem sou?
Minguadinho, dá dó, só de olhar pros cambitos.
Foi o apelido “Osso” que, entre os mais raquíticos,
Lhe deu um certo status, a voz de comando:
O título de capitão do tosco time.
E, três anos depois, parece de regime
Pois os ossos agora estão abandonando
Ou prestes a pular fora de seu corpinho,
Que, de grande, só tem os olhos, o focinho,
E a maldade à flor da pele. Manda bem
E não tem discussão. Faz o que lhe convém:
“É sem contrariedade. Tá sabendo, irmão?
Aqui o mundo tem dono, se quiser te mostro
Os papéis, registrei tudinho e não tem outro.
Céu, terra, água, fogo, ar, floresta e vulcão.
É tudo meu. Do Osso, o duro de roer.
Me diga que não, quem tá pronto pra morrer.
É sem contrariedade. Tá sabendo, irmão?
Aqui não se discute o teor do meu sermão,
Todos rezam em voz alta e cabeça baixa.
O que eu quero vou lá e pego, não tem erro.
Mas se tiver, então, pode crer, tem enterro.
E pago o funeral co’a grana do meu caixa.
Não sou unha de fome. Tenho sentimento.
Não deixo sofrer quem só teve sofrimento.
É sem contrariedade. Tá sabendo, irmão?
Aqui tem lei da boa. Garante o trintoitão.
Você é tira, gema da vila Igapó,
Irmão de sangue bom, pra você não minto.
Mandei serrar o Zeca ao meio, esse tá extinto.
Os meus magrinhos tavam de olho no mocó
Porque viram o Tonho doidão lá na Roda
E as crianças chorando de fome. É foda!
Daí chegou o Zeca c’o pacote cheio
E foi aquela festa. Quem sabia a que veio?
Quando Preto Feio viu o barraco em chama,
Viu também o Zeca saindo de fininho.
Veio voando me avisar. Chegamos no finzinho.
Não deu pra fazer nada. Voltei para a cama.
Antes de dormir, peço ajuda ao meu São Jorge.
E sonho a noite inteira com o meu serrote.
É sem contrariedade. Tá sabendo, irmão?
O meu santo me entende e entende de dragão”.
- Tá certo, Osso, devo mais uma a você.
O que fez com o corpo? “Botei no churrasco,
No meio das costela, até eu tirei um tasco.
Preto Feio é um bruxo, c’óleo de dendê,
Pimenta malagueta, sal, cebola e alho,
O cara faz uns pratos que são do caralho!”
- Conheço a mão do Feio, mas o que fez da ossada?
“Cortei em pedaços e dei pra cachorrada”.
- Os órgãos e as tripas também, eu aposto.
“ He he he...tá sabendo meu procedimento.
He he he...O povão não comia fazia tempo
Com tal fartura. O Zeca até que tinha bom gosto.
-Ah ah ah ah ah ah! O resto vai pros diabos,
Já deve ter meia dúzia comendo o seu rabo!
“He he he...Pode crer! O teu amigo aqui
É o dono do mundo. Do Oiapoque ao Chuí
É meu centro de operações. Entende, irmão?”
- Você que sabe, só não quebre a nossa lei.
Eu teria sido um grande poeta, quase um rei,
E sou um policial. Menos: um escrivão,
Um bosta escrevendo merda o dia inteiro,
Mas na noite há mistérios e eu sou seu parceiro!
Fim do capítulo 4
25 Comentários:
Você é foda, Polaco. Tá ficando genial a história.
Abraço
Nelson Frommer
Assino embaixo.
Gosto mais do jeito que o enredo pega nesta do que nas outras duas. Tou ansioso pra ler mais!
Abraços
Isso é ducaraíssimo.
Impressionante a sua maneira de montar o enredo. De duas peças soltas (1 e 2), o 1 o 3 e o 4 já estão brilhantemente integrados e criando uma perspectiva nova com a entrada do Osso. Nem imagino como o 2 vai se integrar, mas já estou estalando os dedos. O espetacular disso tudo é que as 3 novelhas são totalmente diferentes, sinceramente eu não sei como vc consegue fazer isso.
Com admiração e carinho
do
Flávio Scoretto
Sem comentários. Tu é foda.
Marcondes
Por tudo que vc já fez, pelo menos do que eu li e ouvi,vc merecia uma estátua em praça pública, poeta. Vc consegue ser absolutamente genial o tempo todo.
Grande abraço
Ruy Polissiero
Caralho, quando eu penso que o poema já deu tudo que tinha que dar, vc me sai com esse capítulo.
Não sei mais o que te dizer, mas gostaria de te pagar todas aqui em são paulo. Vou lá dia 9 e conversamos.
Grande abraço
Arthur Fialho Netto
Concordo com todos, menos com o Paulo, acho que não dá pra comparar as obras. Cada uma tem as suas características próprias, e são únicas. O Flávio mandou bem, acho que ele está pensando como eu.
Acho que o enredo se fortaleceu de uma maneira impressionante e segue aquela linha de surpreender sempre das outras novelhas. Tô aqui pra acompanhar nem que morra.
Abraçãozaço
Arrasador.
Beto
O que eu mais admiro na sua poesia, Polaco, é a simplicidade.
Me impressiona muito o modo como vc escreve. É muito fácil, tão fácil que pra maioria se torna impossível. É óbvia, portanto, inalcançável. Eu tb escrevo e quando te leio vejo o longo caminho que ainda vou ter que percorrer. Mas aqui aprendo sempre.
Vc deve rir ao ler esse comentário, pq vc não deve gostar de ser tratado como mestre, mas pra mim vc é.
Incrível essa tua pegada.Parabéns.
Léo Almeida
Me diverti pra caralho.
Renato
Desculpem o andamento da novelha, mas depois de uma trabalheira infernal, caí de cama entre uma gripe e uma pneumonia, possivelmente. Não fui ao médico pra conferir. Mas depois de 10 dias, começo a me sentir com forças novamente. Escrevi o 3 e o 4, no pau da goiabeira. Mas vou tentar terminar os seis capítulos que faltam nos próximos 10 dias. Já estou com o enredo definido, é só escrever. Tive tempo de sobra pra pensar enquanto estive adoentado. Um pouco mais de paciência.
Abraço a todos
Fique bom e bem. Rezo por você. Desculpe o meu comentário de ontem.
Bj
BB
Tome chá de guaco, Thadeu. De 3 em 3 h e adoce com mel. Vai te ajudar bastante.
Abraço
Maria Luíza
Cuidado pra não ter uma recaída. Essa gripe quando volta é pior ainda. Melhoras.
Fabiano
Porreta!
Dani
Hoje vc é o melhor poeta do Brasil não tenho a menor dúvida.
Alberto Molina
Com toda certeza
Com toda certeza.
Mario Virmond
Te cuida, querido.
Proteja-se dos ventos encarnados!
Maringas
Melhoras, Thadeu. Vá ao médico, porra.
meus olhos arregalaram quando percebi a conexão entre o 1,3 e 4.
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