polacodabarreirinha

Poesia, música, gracinhas e traquinagens

segunda-feira, setembro 05, 2005


Batista, conte pra mim a coisa mais engraçada que já aconteceu na tua vida.

Rapaz, eu fui para o garimpo para encontrar ouro. E lá é assim: uns chegam com pickup e trator e saem com a mochila nas costas; outros chegam com a mochila nas costas e saem com pickup e trator. Eu saí de lá com malária, homem de Deus. O que eu ganhei não deu nem pra pagar os remédios (rsrsrs), mas eu curei, meu sangue está bom, graças a Deus.

E a coisa mais triste?

Gostava muito do meu pai, ele trabalhou a vida inteira, mandava dinheiro para eu poder viver e estudar e, quando ele morreu, eu estava internado no Hospital Pinheiros e não pude ir ao velório dele. Isso é que é uma coisa triste, não poder ir ao enterro do próprio pai.

O teu problema com o alcoolismo foi muito sério. Vc esteve várias vezes internado em diversos hospitais. Como foi esse período da sua vida, poeta?

Foi triste. Estive três vezes internado no Hospital Pinheiros, duas no Pinel, uma no Nossa Senhora da Luz, uma em Piraquara e uma em Mal. Cândido Rondom. Oito vezes eu estive internado.

E quanto tempo em média cada internamento, Batista?

Eu não gosto nem de lembrar, porque quando vc entra lá fica que nem preso. E tem hospitais que separam os alcoólatras dos outros doentes, daqueles que enlouqueceram, mas tem outros que não separam. E daí tua vida vira um inferno. Mesmo assim encontrei psicólogos, psiquiatras que me deram força. Mas te digo uma coisa com toda a certeza, não é lá dentro que o cara se recupera, não é com o tratamento. O alcoólatra, o cocainômano, é internado fica lá de 30 a 45 dias e não sai recuperado, no máximo, ele se desintoxica um pouco. Na última vez que eu saí do hospital, fui pra casa da mãe em Palma Sola, no bairro Palmares. Não é o do Zumbi, aquele é meu herói e herói da raça. Veja, eu já estava andando de muletas e só havia um bar que me vendia pinga, cujo dono se chama Santo, pois a polícia proibiu os bares de me venderem bebida. Eu estava feio na fotografia, pra beber um gole, tinha que segurar o copo com as duas mãos. Às vezes eu conseguia um amigo pra comprar pra mim, mas daí a mãe ficava muito triste comigo. Ela já tem 63 anos, é viúva, e eu fazendo essas coisas. Meu café da manhã era cachaça pura, sabe aquele martelinho que aqui em Curitiba custa um real?, lá em Palma Sola é trinta centavos, então, já viu, né, homem de Deus. Mas um dia, de repente, cheguei lá no Santo e pedi um guaraná. O Santo pensou que eu tinha pirado de vez, ficou me olhando com aquela cara de quem não está entendendo nada e depois de 20 minutos me deu o guaraná. Eu peguei o refrigerante com a mão tremendo e assim foi uma semana daquele jeito. Passou um tempo, saí da muleta e fui pra bengala. Só então caí em mim: eu já não tinha mais minha barraca na Feira de Artesanato aqui em Curitiba, não tinha mais meus livros, não tinha camisetas, eu tinha trocado por pinga tudo aquilo que eu mais gostava. Foi triste pra mim chegar a essa conclusão. Eu estava no meio da rua, sem nada, nem carteira de identidade eu tinha mais.
Era eu e a roupa do corpo. E foi assim, a partir do nada, que eu me curei. Hoje eu já não bebo, não fumo e estou começando a recuperar todas as perdas. Não conto mais os dias que estou sem beber e sem fumar. A cada novo dia, eu me levanto, tomo meu café e vou à luta. É assim que eu gosto. É assim que eu sou feliz. É assim que eu quero minha vida: um poema que valha a pena.

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