polacodabarreirinha

Poesia, música, gracinhas e traquinagens

sábado, setembro 03, 2005

Ciúme


Ciúme

O ciúme é um tapete de unhas.
( Maiakóvski )


O que o ciúme já produziu de baixo-astral não é bolinho. Frituras, forcas, tiros, facadas, machadadas, incêndios, envenenamentos, saltos espetaculares para a morte ou, se preferirem, cursos intensivos para anjos, guerras, esquartejamentos, intrigas, separações e isso sem contar os que foram enterrados vivos. Crêndios padre, não é fácil sobreviver à evolução dessa espécie de sentimento. Dalton Trevisan, nosso amado mestre, protetor e muso, já nos deu sobre esse assunto tantas e tantas páginas, tão tragicamente belas e líricas, que ficamos com ciúme.


óleo de baleia


mulher da gente nos olhos dos outros é refresco
pra sentir ciúme tem que pagar mais preço
algum alguém está acima de qualquer suspeita ?
esquimó oferece a mulher pra não fazer desfeita
como se explica esse costume tão primitivo?
é que um esquimó macho tem sangue frio e ó positivo
sabe que entregar a mulher de bandeja lhe devolve o olhar
o olhar que ela tinha quando só tinha olhos para o olhar

Antonio Thadeu Wojciechowski e Sérgio Viralobos


Trecho do Inferno, protagonizado por duas vítimas do ciúme, que conversam com Dante.

As almas atenderam ao que eu quis:
“A paixão que nos uniu, uniu tão forte
que, como vês, até aqui aparenta ser feliz.

Estamos juntos desde a gêmea morte:
esfaqueados, em flagrante, por meu irmão caim.
Naquele dia, líamos a história de Lancelote,

eu só vendo nela o que ela via em mim.
Ela e Guenevére, não sei mais a quem beijei (*)
e o enredo desse amor nos envolveu enfim.

(*) Personagem do livro que, no capítulo que os amantes liam,
se entrega a Lancelote.

Divina Comédia, de Dante Alighieri, em livre adaptação de
Antonio Thadeu Wojciechowski, Marcos Prado e Sérgio Viralobos.




sumiu o ciúme
vaga vazio
o vagalume

Paulo Leminski


que ciúme ?


que filme
é esse que me assiste
de camarote

um susto, um cavalo,
um trote?

que ciúme
é esse que me assiste

um drama
uma comédia, um xiste?

Teda Bara,
Tarzan, Maciste?

que ciúme
é esse que me assiste
que insiste
insiste
e nunca desiste?

Solda


Dalton Trevisan, em três movimentos.

1.

Domingo, de volta do futebol, ele serve-se de uma cachacinha, liga o rádio.
- Sabe, paizinho?
É o menino de seis anos, todo prosa.
- O que, meu filho?
- Essa a música que a mãe dança com o tio Lilo.


2.

Do meu coração ela fez almofada furadinha de alfinetes.


3.

- Domingo eu estava na janela. Passou um carro, era o dentista, que acenou alegre. Ao lado um homem que não vi direito. Eu também acenei. Durante a semana que fim levou o sargento? Liguei para o quartel. Já sei do sinal para o dentista. Acha que sou corno manso? Quer saber do quê? Vá pra o inferno você. Bati o telefone com tanta força, a moça olhou assustada. Me diga, João. O que é corno?
Ele explica direitinho.
- Ah, é isso? Puxa, nunca pensei.

Dalton Trevisan


Culpa no Cartório

O ciúme entrou
pesadamente
no auditório.
Pediu a palavra,
abriu um dicionário.

Mas como culpa puxa palavra
que puxa outra do estoque,
sob apoio ruidoso da claque,
negou qualquer aparte.

Reclamando da sorte
puxou do seu colete
a lista telefônica
de Nova Iorque.

Roberto Prado


amor, fui ali na esquina procurar um fusca gelo
nossa paixão derreteu
já tinha acontecido comigo no caso do fusca verde
quando nosso amor apodreceu
lembro como se fosse hoje quando você disse
que estava saindo com o mário e eu perguntei que mário?
até com xunda e o loxas você me traiu

amor, não sei se te mato ou vou embora
talvez eu faça as duas coisas
mas antes preciso te beijar porque te amo

Marcos Prado

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