polacodabarreirinha

Poesia, música, gracinhas e traquinagens

sábado, abril 22, 2006

WILSON BUENO/ ESPECIAL PARA LIVRO DE DANTE MENDONÇA

Não haverá mais polacos?


Tenho para mim, que é sempre tempo de homenagear os polacos, esta gente que conosco construiu boa parte da mais recente história paranaense. Amo os polacos e tenho por eles uma empatia que, como dizia minha saudosa Helena Kolody (uma “quase-polaca”...), se perde “na trevosa noite dos tempos”.
Foi com eles, os polacos, que a família, recém-chegada do Norte pioneiro, migrantes de cara encardida e modos bugres, aprendemos a fazer as compotas de pepino, além do chucrute em folhas de parreira que embora não seja uma iguaria tipicamente polaca, eles dominavam à perfeição.
Nas discórdias, comuns nas vilas proletárias de então, nos xingavam - “negrada!”; nós, de nosso lado, cuspíamos o insulto escabroso - “polacada azeda!”... No fundo, e na superfície, em tudo éramos iguais. E a nostalgia bate espessa a cada vez que, por um motivo ou outro - agora, foi uma comovente exposição no Museu Paranaense, chamada Raízes do Paraná -, me vejo às voltas com eles, os polacos. Misturou-se nossa vida de tal modo à deles que, por vezes, me sinto um polaco inteiro...
Por certo não é índio, nem bugre, o sentimento em que me flagro, com freqüência, a chorar pitangas e amoras. Também me vem deles, dos polacos, e sinto isso quase como uma matéria táctil, o incurável lirismo que já me integrou o perfil e o jeito - irreversivelmente.
Não para menos, leitor: ao tempo em que, crianças, ainda existiam os filhos de legítimos polacos vindos da velha Polska, me criei com eles, rolando nas brigas infames no chão de terra da Visconde de Nácar; ao lado deles estudei nas escolas públicas; com eles, o jogo do bafo das balas Zéquinha.
Além, claro, do privilégio de conviver, da adolescência até o último dia de sua breve vida, com, dos polacos, o mais insigne - o poeta Paulo Leminski. A quem eu chamava de “Pablo”, como a seu irmão, outro polaco inolvidável, que, sendo Pedro, passou a se chamar “Piotr”, entre os íntimos.
Com ambos revirei as noites cachorras da Curitiba daquele tempo e pusemos, mais de uma vez, nossa vida ao avesso, não é mesmo Jaime Lechinski? Ou me desminta aí poeta Thadeu Wojciechowski! E juntos compusemos sonetos, canções, haicais. E nos passeios e escaladas ao Marumbi, melhor do que nós ou a memória de nós, que o digam mochilas, violões, estrelas...
Olho lá longe, e em meio à lembrança de meus mortos queridos, o que vejo lá é mais que um quadro de Andersen invadido pelo entardecer de Curitiba. Na memória antiga, vislumbro, como a uma fotografia, a velha “ômama”, lenço na cabeça, sentadinha numa solitária cadeira posta no quintal, o avental sobreposto ao comprido vestido até os pés - estes, por sua vez, enfiados nas meias e nos chinelos. À volta dela, muito eretos, rindo, sujinhos, as franjas cor de milho, quatro ou cinco polaquinhos - endiabrados.
Olhar lá atrás, assim, é quase uma lágrima.

(Ao Thadeu Wojciechowski)

Wilson Bueno

8 Comentários:

Às 23 abril, 2006 , Anonymous Anônimo disse...

Compartilhar - quando tudo que temos
é de todos e todo o pouco que se tem
fica maior ainda.
Adoro este blog por isto, entre muchas
otras cositas.

 
Às 23 abril, 2006 , Anonymous Anônimo disse...

Me senti homenageadfo também. Belíssimo texto.

Roberto Trompowski

 
Às 23 abril, 2006 , Anonymous Anônimo disse...

De polaco e louco todo mundo tem um pouco.

Beto

 
Às 23 abril, 2006 , Anonymous Anônimo disse...

Os polacos são tudo ET. Vá tentar compreender...

Susana Domakoski

 
Às 24 abril, 2006 , Anonymous Anônimo disse...

e eu, que depois de velho, virei polaco pop ascendencia???



Rodrigo

 
Às 24 abril, 2006 , Blogger polacodabarreirinha disse...

Pois é né, Rodrigão, tem sangue polaco na Carmela. Agora vc ter que trazer uma vodka polska quando aparecer por aqui. Aposto que esse texto do Wilson já tocou vc profundamente.

Grande abraço

 
Às 24 abril, 2006 , Blogger polacodabarreirinha disse...

Ô, Leandro, passei no teu blog. Obrigadão pela postagem do meu poema. E vejo pelo sobrenome que temos a mesma origem. Apareça no Wonka amanhã (terça) e tomaremos uma bela vodka.

Abração

 
Às 24 abril, 2006 , Blogger polacodabarreirinha disse...

Ih, apareceu polaco de tudo quanto é lado. Até vc, Roberto! Fazia tempo hein? Ô, Fraga, vc precisa aparecer pra conhecer esses polacos, tudo coisa do outro mundo.

 

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