Natureza
Procura-se viva ou morta.
Milagre da natureza é sermos tratados assim, vivermos desse jeito
Procura-se viva ou morta.
Milagre da natureza é sermos tratados assim, vivermos desse jeito
e ainda estarmos aqui, eretos e elegantes, quais araucárias descabeladas ao vento. Como é que um neo-liberal selvagem globalizado qualquer ainda não teve a idéia de nos derrubar para construir um shopping center em cima? Vade retro! E para espantar os demônios da ignorância, nada melhor que invocar a palavra de um santo, S. Antônio de Pádua, em texto escrito no século XIII e trazido à luz por Ione Prado, na sua peça Mãe Terra:“Que os egoístas se tornem humildes e operosos como aquele campo de trigo. Que a consciência dos avarentos possa se abrir como as flores do campo e refletir o céu com limpidez e pureza. Que o homem, por mais que se desvie do seu caminho, jamais possa destruir a natureza, que é de todos. Pai, eu acredito firmemente que a verdade, quando praticada em sua essência, pode libertar a todos, libertar das cadeias das próprias imperfeições. Desejo ardentemente que toda Tua obra seja respeitada. Desde a mais humilde erva do campo até os homens, as mulheres, as crianças! Até o último instante que me reste, eu lutarei por isto!”
Só por um capricho da natureza e de caras como o que escreveu essas benditas palavras há 700 anos (no tempo em que a terra ainda era quadrada) é que chegamos até aqui. No pau da goiabeira. Daqui pra frente o buraco é mais embaixo, que tal irmos à luta?
dez mandamentos
delire na criança
não bula na flor
pense estrelas
não rele no bicho
gire o sol
não zombe do bem
sofra uma lua
não duvide do amor
acredite nos amigos
e não saia da sua
Roberto Prado
os dois lados do mesmo buraco
1. Buraco quente, Brasil
Só por um capricho da natureza e de caras como o que escreveu essas benditas palavras há 700 anos (no tempo em que a terra ainda era quadrada) é que chegamos até aqui. No pau da goiabeira. Daqui pra frente o buraco é mais embaixo, que tal irmos à luta?
dez mandamentos
delire na criança
não bula na flor
pense estrelas
não rele no bicho
gire o sol
não zombe do bem
sofra uma lua
não duvide do amor
acredite nos amigos
e não saia da sua
Roberto Prado
os dois lados do mesmo buraco
1. Buraco quente, Brasil
Falta apenas um ano e meio pro ano do dragão
Como diz o chinês
Não vai ser mole
Não vai ser mole não
Muito mais automóveis
Muito mais poluição
Diga adeus à sua praia
Nunca mais sob o sol de calção
Câncer de pele vai matar até o negão
Nunca mais teu bronze na minha mão
2. Buraco frio, Inglaterra
Mais buracos na camada de ozônio, por favor
O inferno é um lugar frio
Paraíso é onde rola calor
Deixe que a antártida derreta
Que toda a população da Terra seja preta
Neve é pra masoquista
Finlandês metido a macho
Gelo só é bom goela abaixo
José Alberto Trindade
terrapia
Lá se vai o velho julho
chega um novo agosto:
o verde virando palha
enquanto crescem os brotos
E o céu fica assim cinza
devido à queima dos sonhos
e a fumaça dos neurônios
de tanta gente ranzinza
Domingos Pellegrini Jr.
terra nostra
Fora essa estrelinha apagada,
Acho que não temos mais nada
E ela está toda suja e devastada
Ela é nossa casa, nossa única casa
E olhe só o estado da coitada.
Bertold Brecht (Alemanha, 1898-1956, tradução de Antonio Thadeu Wojciechowski e Roberto Prado)
a 365 rotações por ano
A Terra faz mais uma revolução
E eu me viro
Sem entrar nos eixos.
Alberto Centurião
perfume
Ao olfato cabe o específico
detectar do aroma exato.
Na memória, um objeto explícito
ganha cor, gosto, som e tato.
Se na mente o odor não está contido
é natural que gere uma química fascinante
e o organismo vibre em busca do sentido
que, fluido, foge à razão volatizante.
Mais do que esse poema, o perfumista diz:
“Do profundo abismo ao inacessível penhasco,
colhi o que está bem debaixo do seu nariz:
a natureza, corpo e alma, neste frasco.”
Antonio Thadeu Wojciechowski e Marcos Prado
mundo em mudança
perder tempo
com
rosas
óperas
relógios
muda
a rosa
mudo
o relógio
mudam
as óperas
e eu aqui
surdo
mudo
perdendo tempo
com o mundo
Luís Antônio Solda
duas naturezas inéditas
1.
O velhote, bem tristonho:
- Ainda fica duro, o carinha.
Só que não trava.
2.
O tiquinho de gente se inicia
nas artes do lápis de cor.
- Esse desenho tão bonito, minha filha, o que é?
- Ai, mãezinha. Você não vê?
Uma floração psicodélica de riscos e rabiscos.
- É o barulho do sol acordando.
Dalton Trevisan
a árvore da serra
- As árvores, meu filho, não têm alma!
E esta árvore me serve de empecilho...
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!
- Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pôs almas nos cedros...no junquilho...
Esta árvore, meu pai, possui minha alma!...
- Disse - e ajoelhou-se, numa rogativa:
“Não mate a árvore, pai, para que eu viva!”
E quando a árvore, olhando a pátria serra,
Caiu aos golpes do machado bronco,
O moço triste se abraçou com o tronco
E nunca mais se levantou da terra!
Augusto dos Anjos (1884-1914)
na casa errada
O mundo é a casa errada do homem. Um simples resfriado que a gente tem,
um golpe de ar, provam que o mundo é um péssimo anfitrião. O mundo não quer nada com o homem, daí as chuvas, o calor, as enchentes e toda sorte de problemas que o homem encontra para a sua acomodação, que, aliás, nunca se verificou. O homem deveria ter nascido no Paraíso.
Nelson Rodrigues (1912-1980)
a natureza da neura
grande dia, nuvens, vai chover, ainda bem.
moro no caminho dos bombeiros e das ambulâncias.
aqui nunca há silêncio.
os lixeiros fazem toda a operação de estraçalhamento do lixo
em frente ao prédio.
Marcos Prado (1961-1996)
DNA NDA
células vivas
uma
duas
bilhões de belas libélulas
visões do fundo
do poço:
medula
carne e osso
Antonio Thadeu Wojciechowski
o paraíso perdido
meu avô macaco
aquele que darwin buscou
me olha do galho:
busca a força dos caninos
o vigor dos pulsos
o arfar do peito
o menear da cabeça
o trabalho
tudo se foi
nada mais resta
do fulgor primata
da força de boi
saber
saber mata
Paulo Leminski
(1944-1989)
a natureza do eterno
que flor é esta?
finge que morre
e quando menos se espera
é flor indo, flor vindo, floresta em festa
que flor é esta
que sempre resta?
Alice Ruiz
as árvores
As árvores são fáceis de achar. Ficam plantadas no chão. Mamam do sol pelas
folhas e pela terra bebem água. Cantam no vento e recebem a chuva de galhos abertos. Há as que dão frutas e as que dão frutos. As de copa larga e as que habitam esquilos. As que chovem depois da chuva, as cabeludas. As mais jovens; mudas. As árvores ficam paradas. Uma a uma enfileiradas na alameda.
Crescem para cima, como as pessoas. Mas nunca se deitam. O céu aceitam.
Crescem como as pessoas, mas não são soltas nos passos. São maiores mas
ocupam menos espaço.
Arnaldo Antunes
a vida é terra
como é bom estar vivo
e participar dessa maravilhosa aventura
que é estar sobre o planeta terra
dois terços de água e ainda sobra espaço
pra tanta gente tão bela
oxigênio pra abrir os pulmões das algas dos sete mares da terra
a terra manda no céu e o céu é da cor azul do planeta terra
às vezes fico basbaque com o show de vulcões
expelindo magma pra fora dela
os espíritos adoram rodar a bolsinha em nossa esfera
ainda por cima a aurora boreal
que desgraçadamente não posso ver desse ponto da terra
e nela vamos girando e torcendo pra nos seja leve, ela, que nos leva
sagrado torrão do espaço, todos,
desde os que em ti estão enterrados,
te desejam eterna,
Terra.
Antonio Thadeu Wojciechowski, Sérgio Viralobos e Walmor Goes
Fora essa estrelinha apagada,
Acho que não temos mais nada
E ela está toda suja e devastada
Ela é nossa casa, nossa única casa
E olhe só o estado da coitada.
Bertold Brecht (Alemanha, 1898-1956, tradução de Antonio Thadeu Wojciechowski e Roberto Prado)
a 365 rotações por ano
A Terra faz mais uma revolução
E eu me viro
Sem entrar nos eixos.
Alberto Centurião
perfume
Ao olfato cabe o específico
detectar do aroma exato.
Na memória, um objeto explícito
ganha cor, gosto, som e tato.
Se na mente o odor não está contido
é natural que gere uma química fascinante
e o organismo vibre em busca do sentido
que, fluido, foge à razão volatizante.
Mais do que esse poema, o perfumista diz:
“Do profundo abismo ao inacessível penhasco,
colhi o que está bem debaixo do seu nariz:
a natureza, corpo e alma, neste frasco.”
Antonio Thadeu Wojciechowski e Marcos Prado
mundo em mudança
perder tempo
com
rosas
óperas
relógios
muda
a rosa
mudo
o relógio
mudam
as óperas
e eu aqui
surdo
mudo
perdendo tempo
com o mundo
Luís Antônio Solda
duas naturezas inéditas
1.
O velhote, bem tristonho:
- Ainda fica duro, o carinha.
Só que não trava.
2.
O tiquinho de gente se inicia
nas artes do lápis de cor.
- Esse desenho tão bonito, minha filha, o que é?
- Ai, mãezinha. Você não vê?
Uma floração psicodélica de riscos e rabiscos.
- É o barulho do sol acordando.
Dalton Trevisan
a árvore da serra
- As árvores, meu filho, não têm alma!
E esta árvore me serve de empecilho...
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!
- Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pôs almas nos cedros...no junquilho...
Esta árvore, meu pai, possui minha alma!...
- Disse - e ajoelhou-se, numa rogativa:
“Não mate a árvore, pai, para que eu viva!”
E quando a árvore, olhando a pátria serra,
Caiu aos golpes do machado bronco,
O moço triste se abraçou com o tronco
E nunca mais se levantou da terra!
Augusto dos Anjos (1884-1914)
na casa errada
O mundo é a casa errada do homem. Um simples resfriado que a gente tem,
um golpe de ar, provam que o mundo é um péssimo anfitrião. O mundo não quer nada com o homem, daí as chuvas, o calor, as enchentes e toda sorte de problemas que o homem encontra para a sua acomodação, que, aliás, nunca se verificou. O homem deveria ter nascido no Paraíso.
Nelson Rodrigues (1912-1980)
a natureza da neura
grande dia, nuvens, vai chover, ainda bem.
moro no caminho dos bombeiros e das ambulâncias.
aqui nunca há silêncio.
os lixeiros fazem toda a operação de estraçalhamento do lixo
em frente ao prédio.
Marcos Prado (1961-1996)
DNA NDA
células vivas
uma
duas
bilhões de belas libélulas
visões do fundo
do poço:
medula
carne e osso
Antonio Thadeu Wojciechowski
o paraíso perdido
meu avô macaco
aquele que darwin buscou
me olha do galho:
busca a força dos caninos
o vigor dos pulsos
o arfar do peito
o menear da cabeça
o trabalho
tudo se foi
nada mais resta
do fulgor primata
da força de boi
saber
saber mata
Paulo Leminski
(1944-1989)
a natureza do eterno
que flor é esta?
finge que morre
e quando menos se espera
é flor indo, flor vindo, floresta em festa
que flor é esta
que sempre resta?
Alice Ruiz
as árvores
As árvores são fáceis de achar. Ficam plantadas no chão. Mamam do sol pelas
folhas e pela terra bebem água. Cantam no vento e recebem a chuva de galhos abertos. Há as que dão frutas e as que dão frutos. As de copa larga e as que habitam esquilos. As que chovem depois da chuva, as cabeludas. As mais jovens; mudas. As árvores ficam paradas. Uma a uma enfileiradas na alameda.
Crescem para cima, como as pessoas. Mas nunca se deitam. O céu aceitam.
Crescem como as pessoas, mas não são soltas nos passos. São maiores mas
ocupam menos espaço.
Arnaldo Antunes
a vida é terra
como é bom estar vivo
e participar dessa maravilhosa aventura
que é estar sobre o planeta terra
dois terços de água e ainda sobra espaço
pra tanta gente tão bela
oxigênio pra abrir os pulmões das algas dos sete mares da terra
a terra manda no céu e o céu é da cor azul do planeta terra
às vezes fico basbaque com o show de vulcões
expelindo magma pra fora dela
os espíritos adoram rodar a bolsinha em nossa esfera
ainda por cima a aurora boreal
que desgraçadamente não posso ver desse ponto da terra
e nela vamos girando e torcendo pra nos seja leve, ela, que nos leva
sagrado torrão do espaço, todos,
desde os que em ti estão enterrados,
te desejam eterna,
Terra.
Antonio Thadeu Wojciechowski, Sérgio Viralobos e Walmor Goes
6 Comentários:
Notem que o Trindade, já naquela época, previa o vôo do dragão do consumismo chinês. E olha que isso é só um detalhe dentro das maravilhas aqui reunidas...
Roberto Prado
Maravilhosa essa página da Natureza. É sempre um prazer pintar por aqui.
BB
A turma adorou, professor, esse tema gerou muitos comentários, contos e poemas. Aguardamos uma nova visita.
Profa. Maria Luíza
É só convidar, professora, fiquei encantado com a semana de literatura que vcs promoveram. Gostei da interpretação dos alunos e do envolvimento dos professores com o evento.
Grande abraço a todos
Thadeu
Isso que eu chamo de um cacete bem dado. Ninguém faz porra nenhuma pelo meio-ambiente, acho que vocês vão pregar no deserto.
Roberto Siqueira Ramos
Muito bom mesmo. cada vez gosto mais desse blogue.
Abraço
Ivan Siqueira
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