Me apinchei sobre a tradução que o meu amigo
Rodrigo Garcia Lopes fez do poema
RELATO VERDADEIRO DE UMA CONVERSA COM O SOL EM FIRE ISLAND, de Frank O’hara, e fiz uma livre adaptação do mesmo. Quem quiser saber mais sobre o poema, o poeta, ou quiser conhecer a tradução do Rodrigo. Clic aqui.
Meu sol de segunda
O Sol cedo me acorda com estardalhaço:
“Porra, meu, tá pensando que tenho o dia inteiro?
Há bons quinze minutos que faço um salseiro
E você dorme, ronca e peida, seu palhaço!”
“Ah, vai cagar no mato, enquanto eu me lembro!”
“Não seja idiota, poeta! Tive dias melhores
Com outros de valor e calibre maiores,
Mas, pessoalmente, só um teve merecimento.
Portanto, segundão, deixe de ser bundão
Ou eu o pururuco todo como um porco!
Vai, se mexe, me prove que é seu esse corpo,
Pra lhe esquentar o rabo, dispenso o fogão!
Mas não quero mandar lenha em sua bela casa
E nem ficar aqui perdendo tempo, porra!”
“Ok! Você venceu! Porém, antes que eu morra,
Deixe-me beber toda água que está na caixa.”
“Que puta ressacão! Foi no cu da madruga
Que tomou todas, tá na cara, beberrão!
Depois é isso, se esparrama pelo colchão,
E pra lhe acordar é aquele Deus nos acuda!”
“Puta que o pariu, bosta de vida! Resmunga,
Reclama, só me fode. Vai catar coquinhos!”
“Pelo menos Maiakóvski me fez versinhos
E, quando o acordei, não vestia uma sunga!”
“Virou cínico agora? Vai rir do teu pai,
Da tua mãe! Você não é a bola da vez.”
“Ah, não? Todos acordam pra ver se o papai
Aqui vai dar a cor que querem em sua tez.”
“Mas ontem deixou todo mundo na espera.”
“Achei que você tinha um outro compromisso.”
“Senti sua falta.” Disse-lhe menos omisso.
E o sol, por toda quinta grandeza da esfera:
“Ah, um pouco de franqueza e a conversa esquenta!”
Pensei em arredondar o jogo pelas pontas,
Mas preferi esperar que apresentasse as contas:
“Eu até gosto muito de você. Vai, senta!
Você não é mau poeta. Tem um bom estilo,
Tem boa pegada e a grande maioria não vê.
Esses borrabostas nunca vão compreender (*)
Um maluco como você, meu bom amigo.
E tem uns outros poetas que o acham um reaça, (**)
Um chato de galocha, mas, para mim, não.
Continue na balada em que está, que está bom
No fundo, todos o olham como uma ameaça.
Mire-se em mim, não dê bola. Vai perceber,
Então, que eles têm sempre uma reclamação
À mão. Ora está frio demais; ora, calorão.
Ora o dia está claro, ora nem dá pra ver.
Ontem curto demais, hoje se alonga tanto.
Se você tira um dia de folga, é preguiçoso
Ou morreu e esqueceu de deitar. Não tem pouso
Nem repouso, mas nosso pique tem seu encanto.
Deixe de lado os poetas que só usam dialetos
E se lambuzam de elogios entre si mesmos.
Eu brilho sobre os mares, florestas, guetos,
Palácios e campinas, não há prediletos.
De onde eu estava, eu via o vento em seus cabelos
E sabia que esse movimento era um sinal:
Hora de trabalhar! E eu na espera, que tal?
Vamos que o tempo urge, comece a escrevê-los.
Ninguém quer poemas? Tudo bem. Só eu, sol, leio.
Não baixe a bola agora. Nem todo mundo pode
Olhar pra cima e me olhar, pois minha luz explode
Suas retinas e ficam mais cegos, eu creio.
Tire uns dias pra si mesmo, eu ficarei de olho.”
“Ah, meu amigo Sol, quanto fico agradecido.
Tudo agora toma um inédito sentido!”
“Fique tranqüilo e bem. Meu fogo já recolho.
Pra mim, fica mais fácil conversar daqui,
Não preciso ir pela sombra até seus ouvidos.
Nem todo me espremer entre os prédios antigos.
Olhe mais para o céu, estou sempre por aí.
Não pense que não sei desses seus sentimentos
Ou imagine que ignoro o amor de sua vida.
Sei muito bem o que sente por Curitiba,
Mas também sei das alegrias e sofrimentos.
Por isso, sempre abrace tudo, céu, terra,
Pessoas ou estrelas, como eu, livremente.
Ter senso de espaço pode ser conveniente.
O seu dom é um milagre que quis ser o que era.
Conhecido no céu, você, tão decidido,
O seguiria até o inferno se preciso.
Mas não vai ser. Pra que sair do paraíso?
Vamos nos ver, pois nosso gosto é parecido.
Talvez na mãe África, que amo de paixão.
Agora, durma. Deixarei em sua cabeça,
Como adeus, um poema que faça e aconteça!”
Eu acordei, enfim. “Sol, não vá embora, não!”
“Preciso ir, estão me chamando.” “Eles quem?”
“Qualquer dia desses então vai saber quem são,
Pois eles chamando você, também, estão.”
De soslaio, o sol me olha, mas já durmo bem.
(*) O mesmo que borrabotas
RELATO VERDADEIRO DE UMA CONVERSA COM O SOL EM FIRE ISLAND, de Frank O’hara, e fiz uma livre adaptação do mesmo. Quem quiser saber mais sobre o poema, o poeta, ou quiser conhecer a tradução do Rodrigo. Clic aqui.
Meu sol de segunda
O Sol cedo me acorda com estardalhaço:
“Porra, meu, tá pensando que tenho o dia inteiro?
Há bons quinze minutos que faço um salseiro
E você dorme, ronca e peida, seu palhaço!”
“Ah, vai cagar no mato, enquanto eu me lembro!”
“Não seja idiota, poeta! Tive dias melhores
Com outros de valor e calibre maiores,
Mas, pessoalmente, só um teve merecimento.
Portanto, segundão, deixe de ser bundão
Ou eu o pururuco todo como um porco!
Vai, se mexe, me prove que é seu esse corpo,
Pra lhe esquentar o rabo, dispenso o fogão!
Mas não quero mandar lenha em sua bela casa
E nem ficar aqui perdendo tempo, porra!”
“Ok! Você venceu! Porém, antes que eu morra,
Deixe-me beber toda água que está na caixa.”
“Que puta ressacão! Foi no cu da madruga
Que tomou todas, tá na cara, beberrão!
Depois é isso, se esparrama pelo colchão,
E pra lhe acordar é aquele Deus nos acuda!”
“Puta que o pariu, bosta de vida! Resmunga,
Reclama, só me fode. Vai catar coquinhos!”
“Pelo menos Maiakóvski me fez versinhos
E, quando o acordei, não vestia uma sunga!”
“Virou cínico agora? Vai rir do teu pai,
Da tua mãe! Você não é a bola da vez.”
“Ah, não? Todos acordam pra ver se o papai
Aqui vai dar a cor que querem em sua tez.”
“Mas ontem deixou todo mundo na espera.”
“Achei que você tinha um outro compromisso.”
“Senti sua falta.” Disse-lhe menos omisso.
E o sol, por toda quinta grandeza da esfera:
“Ah, um pouco de franqueza e a conversa esquenta!”
Pensei em arredondar o jogo pelas pontas,
Mas preferi esperar que apresentasse as contas:
“Eu até gosto muito de você. Vai, senta!
Você não é mau poeta. Tem um bom estilo,
Tem boa pegada e a grande maioria não vê.
Esses borrabostas nunca vão compreender (*)
Um maluco como você, meu bom amigo.
E tem uns outros poetas que o acham um reaça, (**)
Um chato de galocha, mas, para mim, não.
Continue na balada em que está, que está bom
No fundo, todos o olham como uma ameaça.
Mire-se em mim, não dê bola. Vai perceber,
Então, que eles têm sempre uma reclamação
À mão. Ora está frio demais; ora, calorão.
Ora o dia está claro, ora nem dá pra ver.
Ontem curto demais, hoje se alonga tanto.
Se você tira um dia de folga, é preguiçoso
Ou morreu e esqueceu de deitar. Não tem pouso
Nem repouso, mas nosso pique tem seu encanto.
Deixe de lado os poetas que só usam dialetos
E se lambuzam de elogios entre si mesmos.
Eu brilho sobre os mares, florestas, guetos,
Palácios e campinas, não há prediletos.
De onde eu estava, eu via o vento em seus cabelos
E sabia que esse movimento era um sinal:
Hora de trabalhar! E eu na espera, que tal?
Vamos que o tempo urge, comece a escrevê-los.
Ninguém quer poemas? Tudo bem. Só eu, sol, leio.
Não baixe a bola agora. Nem todo mundo pode
Olhar pra cima e me olhar, pois minha luz explode
Suas retinas e ficam mais cegos, eu creio.
Tire uns dias pra si mesmo, eu ficarei de olho.”
“Ah, meu amigo Sol, quanto fico agradecido.
Tudo agora toma um inédito sentido!”
“Fique tranqüilo e bem. Meu fogo já recolho.
Pra mim, fica mais fácil conversar daqui,
Não preciso ir pela sombra até seus ouvidos.
Nem todo me espremer entre os prédios antigos.
Olhe mais para o céu, estou sempre por aí.
Não pense que não sei desses seus sentimentos
Ou imagine que ignoro o amor de sua vida.
Sei muito bem o que sente por Curitiba,
Mas também sei das alegrias e sofrimentos.
Por isso, sempre abrace tudo, céu, terra,
Pessoas ou estrelas, como eu, livremente.
Ter senso de espaço pode ser conveniente.
O seu dom é um milagre que quis ser o que era.
Conhecido no céu, você, tão decidido,
O seguiria até o inferno se preciso.
Mas não vai ser. Pra que sair do paraíso?
Vamos nos ver, pois nosso gosto é parecido.
Talvez na mãe África, que amo de paixão.
Agora, durma. Deixarei em sua cabeça,
Como adeus, um poema que faça e aconteça!”
Eu acordei, enfim. “Sol, não vá embora, não!”
“Preciso ir, estão me chamando.” “Eles quem?”
“Qualquer dia desses então vai saber quem são,
Pois eles chamando você, também, estão.”
De soslaio, o sol me olha, mas já durmo bem.
(*) O mesmo que borrabotas
(**) Reacionário
Livre adaptação de
Livre adaptação de
Antonio Thadeu Wojciechowski
8 Comentários:
legal, thadeu!!!! isso que eu chamo de tradução criativa! posso botar no blog?
abraço amigo
rodrigo
Claro, né, Rodrigo, você que me propiciou a jogada toda.
Grande abraço
Thadeu
Que impressionante, Polaco, não dá pra entender como você tirou da tradução do Rodrigo essa pérola.
Uma jóia de bom humor e encantamento. Quanto mais o conheço mais levo susto.
Cara, você é um gênio!!
Dalton
Thadeu, sua técnica e sua criatividade estão se transformando dia a dia numa coisa muito aguda. É admirável ver o que você fez com a tradução do texto.
É o que o Rodrigo escreveu no blog dele: im-pa-gá-vel!!!
Você terminou a novelha ontem e hoje já sai com essa?
Você deve estar completamente louco. Ou vai morrer de estafa.
Dá um tempo, aí, cara!
Fabiano
a tarde arde com dois sóis. um, rodrigo, outro, thadeu. fenomenais os dois.
grande abraço, gerson.
Lindo.
Bj
BB
do caralho o que vocês fizeram
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