polacodabarreirinha

Poesia, música, gracinhas e traquinagens

segunda-feira, agosto 29, 2005

Em toda a sua obra, mesmo nas mais épicas, há, em determinados
momentos, um tom lírico, emotivo, quase confessional, é ali que mais se mostra o homem Pellegrini?

- Respondo como Jesus: sou o que sou. Sou o cidadão que se indigna, sou o historiador que pesquisa, o menino que se encanta, o amante que se apaixona, o adolescente que descobre, o homem que se procura.

Em que seara vc se sente mais à vontade, poesia, conto, romance ou biografia?

- Me sinto à vontade escrevendo o que tenho vontade de escrever no momento. Nas poucas vezes em que tentei escrever por encomenda, atendendo a pedidos, saíram textos ruins (a não ser, claro, em publicidade ou jornalismo, mas em literatura isto nunca funcionou comigo, então só escrevo movido por vontade). O comando da poesia é instantâneo, a vontade vem, que chamam de inspiração também, pego um papel e escrevo e pronto, em minutos. Os contos vêm na forma da frase inicial, ou de uma cena, que aí desenvolvo em algumas horas. Os romances vêm na forma de interesse crescente e aprofundante por algum assunto ou mistura de assuntos relacionados. Ano passado, por exemplo, fui fazer o Trilho da Machu Pichu, quatro dias andando com Dalva, de mochila, e aí pensei que é o suporte, digamos assim, ótimo para uma discussão sobre minha trajetória política e seus momentos críticos ou mais simbólicos de mudanças (a iniciação estudantil, as passeatas, o quase ingresso na guerrilha, o desvio para a luta eleitoral, a luta pela anistia, a campanha das diretas, a da constituinte, passando também pela morte de Guevara, a guerra do Vietnã etc), tudo isso narrado através das lembranças de dois casais de meia idade que caminham juntos para Machu Pichu, e que acabam trocando de parceiros ao fim da caminhada. É o romance que comecei a escrever há alguns meses, parei para escrever um juvenil chamado A Escola Redonda, sobre questões pedagógicas que muito me incomodam, como essa aberração de estudantes vocacionados para as ciências humanas, terem de estudar ciências exatas para o vestibular.

Qual o livro que mais lhe deu compensações?

- Que tipo de compensações? Se for compensação de conhecimento, ensinamentos, superação e alegria, foi certamente O Tempo de Seo Celso, a biografia de Celso Garcia Cid, que escrevi em parceria póstuma com ele (ele já tinha morrido há duas décadas, mas me ajudou o tempo todo, dando dicas através dos escritos que deixou e dos seus amigos que eu entrevistava.). Ao final, eu, que sonhava ser romancista e tinha já várias tentativas frustradas de escrever romance, vi que tinha ganhado o fôlego, a disciplina e os métodos (de pesquisa, de redação etc) para romances. Muita gente, principalmente jornalistas, que são grandes cultivadores de preconceitos, pensou que ganhei dinheiro da família Garcia Cid para escrever o livro, mas o que ganhei foi isso, pois a proposta foi minha e exigi nada ganhar, para ter liberdade, coisa que descobri depois, a família jamais pensou em me restringir, o que acabou sendo nobre de ambas as partes. É um livro magnífico, e acho que só Terra Vermelha me deu tanto trabalho e prazer. Já compensação financeira, que deu e dá mais é o juvenil A Árvore Que Dava Dinheiro, que já tirou mais de milhão de exemplares (42 edições pela Moderna, mais não sei quantas pela Ática, nesta com 30 mil exemplares por edição, mais uma edição especial para o MEC, de 2 milhões de exemplares).

E o que mais o realizou como escritor?

- Fazer o que gosto, ganhando para isso. É uma mistura de trabalho, diversão, paixão e apostolado, tudo junto. A maior tragédia humana, no sentido de atingir o maior número de pessoas, é trabalhar no que não gosta ou não conseguir gostar do que faz para viver. Comigo é o contrário, e sempre agradeço por isso. Nunca tive a famosa crise de inspiração. Se for preso hoje, tenho o que escrever durante anos na cadeia, é só ter papel e caneta, nem precisa computador.

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