polacodabarreirinha

Poesia, música, gracinhas e traquinagens

quarta-feira, fevereiro 27, 2008


fumo meu último cigarro pela primeira vez




Cigarro

“Escarrar de um abismo em outro abismo
mandando ao céu o fumo de um cigarro,
há mais filosofia neste escarro
do que em toda moral do cristianismo.”

Augusto dos Anjos

Se tem uma indústria que fatura até o nabo é a do cigarro. Com ou sem filtro, com as mais diversas graduações de alcatrão e nicotina, o cigarro já fez muito neguinho, branquinho, amarelinho e vermelhinho virar fumaça. Eu já me sinto mais leve, mas ainda estou quase vivo. Tenho um cunhado, um dos melhores pneumologistas do Brasil, o
Dr. Jairo Sponholz, que só falta me dar tiros quando me vê com um cigarro na mão. Bem, convenhamos, morrer, neste caso, seria bem mais rápido.
Dizem que o cigarro mata lentamente, mas alguém aí está com pressa? Um compositor que não lembro o nome no momento, cantava: “quem não fuma quem não bebe que alegria pode ter?”. Morreu já faz algum tempo, mas a causa mortis foi frieira no dedão do pé esquerdo.
O Leminski e o Marcos Prado fumavam que nem dois condenados. Eu, Roberto Prado, Solda, Walmor Góes, Edílson, Magoo, Marcelo e o Octávio Camargo comemos com farinha e baforamos como sapo índio. O Edson de Vulcanis só fuma por osmose. Um dia, lá pelos anos 90, eu e o Sérgio Viralobos, que não fuma, fizemos as contas de quantos cigarros eu já havia fumado. O total girou em torno de 380.250 cigarros. De lá pra cá, perdi a conta. Mas do poema fiz música de carnaval, gravada pelo Maxixe Machine, no CD Folias de Momo.
Agora, falando sério, tem coisa melhor do que um cigarrinho depois de um café, junto com a cervejinha ou depois de agasalhar o croquete? Pode até ter, mas ainda não cheguei lá. E acho que nem vou chegar porque devo morrer de câncer, enfisema, problemas circulatórios, envenenado como um rato, sem um pedaço da perna, sem dentes, careca ou, pior ainda, impotente. Ai ai ai, acho que amanhã mesmo começo a parar de fumar. Ou, no máximo, semana que vem.

arvorada ou o admirável fumo novo


plantei déis arquere
de fumo do bão
os pé cresceu
que nem os pé de feijão do joão

a roça ficou uma maraviia
eu moiava de noite
eu oiava de dia

não pus espantaio
porque os passarinho
ficaram tudo nos gaio
admirando
admirando
admirando
admirando


Antonio Thadeu Wojciechowski, Édson de Vulcanis, Edílson del Grossi e Ubiratan Oliveira

bolero lero

cada vez que tu me miras
com sus ojos sujos de baton
berrante terete
treamo mas

jo soy un borracho fumegante
à espera de una amante
caliente terete
treamo mas

neste cais que é a vida
companheiro de bar
não fique a ver navios
pois Curitiba não tem mar

não adianta se matar
e nem cortar o seu pescoço
todo galho ou enrosco
é deus que está conosco

Antonio Thadeu Wojciechowski, Luiz Antonio Ferreira, Renato Quege, Rodrigo Barros e Walmor Goes


diário de uma ninfeta prostituída

desde o princípio da humanidade
os homens corrompem as menininhas
em troca de bebida, comida
e queimadura de cigarro

eles chegam em carros possantes
sapato branco reluzente
charutos jamaica, chapéu panamá
e champagnes espoucantes

os que vêm para os prazeres da carne
têm à mão um baby beef
uma garrafa de arak
e uma carteira de free

Alessandro Wojciechowski, Antonio Thadeu Wojciechowski, Edson de Vulcanis e Marcos Prado

eu não vou ter amigos aos 40

meus amigos bebem demais
meus amigos fumam demais
meus amigos falam demais
meus amigos brigam demais
meus amigos morrem demais

do jeito que tudo vai
eu vou ficar
na cidade sem cachorro
bebendo sozinho
fumando sozinho
falando sozinho
brigando sozinho
morrendo sozinho

minha cabeça não agüenta
um por um indo pro saco
rezando prum deus babaco

eu chego sozinho aos 40

Antonio Thadeu Wojciechowski e Roberto Prado



fã de fandango

ai que saudades tenho da baía de Paranaguá
na festa da tainha eu sempre estava lá
olhando aquela água verde até ficar azul
cego por cem sóis vermelhos me guiava o vento sul

tamancos batem no chão
fandango é a nossa canção
pinga de banana na cabeça
fumo caiçara na mão

estou adiantando as horas pra voltar pra lá
tem barco me esperando em Paranaguá
pisando na areia branca fica tudo azul
enfuna as velas do veleiro, me leva, vento sul

tamancos batem no chão
fandango é a nossa canção
pinga de banana na cabeça
fumo caiçara na mão


Antonio Thadeu Wojciechowski, Edílson Del Grossi, Walmor Góes e Ubiratan Oliveira

Levando fumo

quando eu morrer não quero choro nem oração
quero pacotes de holliwood
pra levar muito fumo no caixão

serrei até estourar a caixa toráxica
o escarro e o pigarro eram a tática
pro meu pulmão não se esparramar pelo chão

cigarro de xepas do cinzeiro eu fi-lo
traguei paióva, bituca e matarrato a quilo
equivalo a um quarteirão de nicotina e alcatrão

já enrolei tabaco pra mais de metro
se enfizema fizesse rei, eu tinha coroa e cetro
recordista filão, quebro a marca do milhão

há tosse e sinais defumantes em meu corpinho
alvéolos, brônquios, pleuras, não passam de toucinho
baforo no caixão, resoluto, meu último charuto

Antonio Thadeu Wojciechowski e Rodrigo Barros


nível de periculosidade

quanto uma bactéria pode ser nociva?
esta mariposa por quanto tempo continuará viva?

o conhaque vai acabar
e isto me entristece um pouco
quanto tempo viverei neste bar
até estar morto?

70 cigarros por dia é mortal?
será que hoje é natal?

Antonio Thadeu Wojciechowski e Marcos Prado


o cigarro está me matando de saudade

anteontem no ano passado
meu dedo estava amarelado
preciso de um vício novo
bombom, caracu com ovo
bingo, corrida de cachorro louco

ai que saudades da minha querida nicotina
e do meu velho e bom arcatrão
e da porvinha do paperzinho que fazia
catarrinho, cosquinha no meu purmão

Antonio Thadeu Wojciechowski, José Alberto Trindade, Márcio Goedert e Rodrigo Barros


samba do meu ranchão

estava andando pela rua numa noite
quando meu mundo caiu
astros me pisam distraídos
indiferente o chão fugiu de mim

se essa rua, se essa rua fosse minha
eu andava contramão
paralelepípedos uni-vos
pra eu voltar a ter os pés no chão

se você pensa que vai fazer de mim
o que faz com os carlões por aí
acorda, maria bonita, cachaça não é água não
já fumei mais de um maço e meio
pode vir firme que eu estou tremendo

Antonio Thadeu Wojciechowski, José Alberto Trindade, Rodrigo Barros, Magoo, Walmor Góes e Ubiratan Oliveira


sete palmos abaixo da terra de marlboro


380.250 cigarros depois
resolvi tomar uma atitude
nada de entregar pulmão para ciência
só há um jeito de ir atrás do prejuízo

apresentar os meus raio-x
para uma junta de advogados
agora quero 5 milhões e mais nada
vai ser um raro prazer queimar essa bufunfa
de dentro da tenda de oxigênio

Antonio Thadeu Wojciechowski e Sérgio Viralobos


testamento

fumarei mais um depois do último
minha mãe nunca me viu mais magro
cigarros é tudo que trago
sei que serei apenas um número
um zero a esquerda do além
nem pense que você não é assim também
esconjuro exorbitante
uma vida para mim não é o bastante

Antonio Thadeu Wojciechowski

segunda-feira, fevereiro 18, 2008



Primeiro de Março 2008.



Depois de umas merecidas férias e quase uma centena de novas composições,

dia 1º de março estarei de volta. Até lá.


Polaco da Barreirinha