polacodabarreirinha

Poesia, música, gracinhas e traquinagens

quinta-feira, novembro 30, 2006





Capítulo 6


O povão, no fundo, bem lá no fundo, é bão.


Beatriz diz que já volta, vai tomar um banho,
Trocar de roupa e dar um oi para a família.
Quer que eu faça o mesmo, se não apanho.
Digo que vou e não vou. "Cerveja! Maravilha!"

Quando boto o olho em volta, as coisas vão bem.
Carne no fogo, cerveja, vinho, é servida
Uma lingüicinha com pãozinho também.
Diga leitor (a), quem vai querer outra vida?

Os ânimos estão serenados, me sinto
Tranqüilo, em paz. O que que eu quero mais, Meu Deus!?
O que que eu quero? Uma talagada desse absinto,
Claro, é isso! Primeiro os meus, São Mateus!

Putz, um arrepio levanta todos meus pêlos,
Parece que adivinho, o que vai acontecer.
O seo Nestor, apesar de todos os apelos,
Fez mais um balde de caipira. “Beber!

Vamos beber!” Um pé inchado, de narigão
Avermelhado, berrava e ria, como um louco.
O balde rapidamente ia de mão em mão
E, quando chegou até mim, restava pouco.

O vozerio ultrapassou os decibéis
Permitidos por lei. As fêmeas riam e se abriam
Pra meio mundo. Tive que contar até dez,
Pra não meter a mão onde elas queriam.

- Hein, seo Nestor, quem viu esse pessoal e vê
Agora, não diz que são os mesmos, não é?
- O povão, no fundo, é bão, basta se querê
Bem o próchimo e olhá de longe sua muié.

- Se as pessoas seguissem a sua filosofia,
O mundo não andava com um pé atrás.
Não sei o que ouviu de tão engraçado, ria
Alto e desbragadamente, como quem faz

O que mais gosta. “Voismecê é uma bola.”
Me disse e caiu de novo na gargalhada.
O mulherio veio e o agarrou pela gola,
Pondo fim à nossa agradável palhaçada.

Os punks comem tudo que vem pela frente
E tomam aos litros porretes colossais.
É tão bom ser completamente diferente,
Eu penso, refletindo sobre os animais.

Já bebi mais do que cabe em mim quatro vezes,
A tarde cai e o sol está pegando fogo.
A primavera inteira só dura três meses,
Mas flores nascem durante o ano todo.

Estou pra lá de comovido, essa bebida,
Esse entardecer, essa gente, esse amor,
Que entrou em mim quando eu estava de saída,
Essa vontade de ser seja lá o que for.


Fim do capítulo 6







Capítulo 5

O inferno é mais em cima.


A loira oxigenada, batom roxo, saia
Justa e curta, bate com a bolsa num piá.
No ato, saltam seios do tomara-que-caia,
Não são bonitos, mas ninguém deixa de olhar.

Um sujeito, pintor, pelas manchas de tinta
Nas roupas, mete o pé na bunda da distinta,
Que rola e grita histericamente na grama.
Beatriz intervém, rapidamente e reclama.

O guri, alvo da bolsada, se aproveita,
Ergue a saia da falsa loira e deixa a bunda
Enorme aos olhares da malária inteira.
O pintor, que de tão puto, já está corcunda,

Se agacha mais ainda, agarra o menino
Pelos cangotes e, então, bem devagarzinho,
Começa a apertar c’os dedos seu gorgomilo,
Beatriz fecha os olhos pra não ver aquilo.

O garoto, arroxeado, esperneia mais
Que aposentado quando recebe o extrato
Do benefício. Súbito, um outro malaco
Resolve dar as tintas ao pintor. Jamais

Presenciei tamanha porrada e tão bem dada.
O pintor, primeiro, fica azul; depois, vesgo;
Em seguida, cai duro junto à arreganhada,
Que ainda exibe o pentelhame preto e crespo.

A mãe da loira, sogra do pintor, intrusa
Da festa, sob um ataque de nervos, desmaia
E tem convulsões. O piá vendo a avó confusa,
Chora, abraça a velha e fica de atalaia.

A cena que se segue serviria de exemplo
Para qualquer palestra à cerca do non sense.
O dono aproveita a deixa e não perde tempo,
Passa a mão numa ripa e, insensivelmente,

Começa a cacetear parelho todo mundo.
O corre-corre abre uma clareira imensa,
Os beberrões fazem, aos berros, um rotundo
Protesto. O Jair se acalma e tudo, lenta

E silenciosamente, retorna ao normal.
Acodem o pintor, a loira, o piá e a velha,
Porém um sério deslize, quase fatal,
Põe a mulherada toda em pé-de-guerra.

É que na hora de acudir a velha epilética,
O bebum, que a carrega no colo, tropeça,
Cai e os dois se esborracham, de forma patética,
No chão. A velha rola e bate com a testa

Num toco, que lhe abre uma larga avenida,
Dividindo os dois lados do rosto enrugado.
A mulherada reunida, puta da vida,
Avança contra o borracho que, aterrorizado,

Recua e cai sobre a churrasqueira improvisada.
A cena se inverte e elas engatam a ré
Ao tomar consciência da tremenda cagada.
Queimado, enlingüiçado, da cabeça ao pé,

E ainda de fogo, o bebum sobre a brasa, em chama,
Levanta e, parecendo um monstro de ficção
Científica, dá dois passos em direção
À sua família que grita, chora e reclama,

E cai como um corpo morto cai, desmaiando.
Tenho a impressão de estar dentro de um pesadelo,
Onde todos os movimentos vão passando
Em câmera lenta, como se o meu apelo

Não conseguisse sair da garganta e ser
Ouvido pelas pessoas que me rodeavam.
Ilusão minha. Dois grupos se formaram
Rapidamente como pude perceber.

E dois carros partiram para hospitais
Diferentes. Só então eu disse pra Beatriz,
Que me dizia vamos embora: - me diz
Uma coisa, nas circunstâncias atuais,

Não é melhor ficarmos e esperar notícias?
Ela reluta um pouco, mas sorri e diz sim.
Suas mãos tocam as minhas cheias de carícias
E eu só desejei viver para sempre assim!

Fim do capítulo 5





quarta-feira, novembro 29, 2006


Diversão em alta voltagem, quinta-feira, dia 30, a partir das 20h,
o último a chegar será o último.

terça-feira, novembro 28, 2006




Capítulo 4

O problema, sua mulher e seus probleminhas


O sábado amanheceu todo endomingado
E vestido pra festa. Um sol de rachar
E com mania de quinta grandeza, esquentado,
Deu ao bar um colorido novo, sem par.
Dos sessenta e poucos pés-de-cana, da noite
Anterior, nenhum arredou a bunda e foi-se.

Cerveja da boa, maconha da melhor, kibe,
Coxinha e pastel à vontade, quase tive
Uma congestão por ingestão excessiva
De sólidos, líquidos e gasosos, mas,
Beatriz garantiu-me a compostura capaz
De manter bom humor e alegria expressiva.

Pra quem não sabe, Beatriz é a morena ao lado,
Que, por unanimidade, foi eleita rainha
Do meu coração, deusa da minh’alma, rima,
verso e estrela do palco do meu quarto.
O namoro vai bem, apenas duas intrigas,
Três tapas e uns palavrões é o saldo das brigas.

Mas nada que interfira em nossos sentimentos,
Puros e ternos que, na suscessividade
Dos minutos, vão se transformando em momentos
De profunda entrega e frisson sexual. Verdade
Que, ali no bar, o ato não pode ir até o fim,
Mas o de bêbada não tem dono e assim...

O Jair, proprietário do estabelecimento,
Até ofereceu o quartinho lá do fundo,
Mas meu desejo, esse meu estremecimento,
A sensação de que este é o amor maior do mundo,
Levou-me àquele mesmo arrebatamento
Juvenil, inocente, idiota e profundo.

Eis as razões pelas quais não pulei em cima
E não troquei o óleo na sua bela oficina.
Mas é bom o toque de sua pele, seu beijo,
As palavras sussurradas em meus ouvidos,
Seu cheiro de mel, seus dentes e seus sorrisos,
De repente, são tudo que quero e almejo.

Em nossa mesa, o bom velhinho dorme bem.
Sob ela, um dos punks, o tal de Cobaia,
Desmaiado, dorme melhor do que ninguém.
São dez horas e, antes que meu rabo-de-saia
O acorde com a discussão que começou,
Levo-a ao jardim sob um pessegueiro em flor.

Há uma mesa pequena e nos instalamos.
O tom baixa e a fala ganha um amoroso
Contorno. Logo logo estamos que estamos.
É um tal de pega e aperta mas tão gostoso,
Tão gostoso que ali mesmo ela vai pro pau,
Vítima do meu enorme instinto animal!

Saciado, fecho o zíper e ouço a sentença:
-Só sei que você acabou de me engravidar!
-Como? Mas nós mal nos conhecemos, Beatriz!”
- Sim eu sei, mas a ter filho estou propensa,
Neste período fértil não podia lhe dar.
- Pelo amor dos meus filhinhos! O que é que eu fiz?

- Toda mulher sabe quando ela engravida.
É uma intuição, um poder divino da vida.
- Pai!, vou ser pai! Saio gritando como um louco,
Acordando, derrubando, abraçando a todos.
Recomeçamos a brindar e não foi pouco:
Brindo até com quem tinha me dado uns socos.

Bebemos tanto que alguns, não demora muito,
Começam a vazar. E o vômito em conjunto
Daquela gente veio sobre nós em jorro.
Nem penso: enfio a mão no primeiro cagão,
Que rola sobre a gosma com o bofetão
E transforma o noivado num tremendo esporro.

O nojo acabou com a briga dessa vez.
Fedíamos e o quanto fedíamos não perguntem.
Sei que um não querer encostar no outro fez
Uma pausa e nessa pausa só ouvi: “Ajuntem!
Limpem tudo, seus porcos filhos de uma puta!”
Num minuto ninguém nem pensa mais em luta.

Um pedaço de mangueira vira chuveiro
E eu depois do banho já me sinto inteiro.
O seo Nestor, este espetacular velhinho,
Saíra e voltara com carnes e lingüiças,
Pães, tomates e cebolas, além de vinho,
Cachaça, carvão e muitas outras delícias.

O Jair parte para a ação instantaneamente.
Distribui tarefas específicas, dá
Ordens coletivas e, num piscar de cílios,
O braseiro solta faíscas no olho da gente
E o cheiro da lingüiça na brasa é o que há,
Pra atrair mulheres, sogras e muitos filhos.

Uma caipira num balde de cinco litros
Rolava de mão em mão quando eles chegaram.
Se é verdade que a bebida atrai maus espíritos
Então o inferno entrou por onde eles entraram.
Mais de um casal começa a discutir, brigar,
E a bater nas crianças que passam a gritar.

Fim do capítulo 4






Falta pouco.


Não sei como, um vírus tomou conta do meu computador na sexta-feira à noite. Mas 4 dias depois, o Alexandre, técnico da ACK, entregou-me às 16,30 h o computador formatado e livre da maldição. Então peço agora um pouquinho mais de paciência para eu instalar programas e fazer um balanço do que foi perdido e do que foi recuperado.
Espero e torço pelo melhor.


Grande abraço a todos

Thadeu




quinta-feira, novembro 23, 2006







Capítulo 3


O movimento punk nunca há de morrer


Tudo fudido
Tudo sujo
Essa é uma conversa punk
A gente acredita em si
Mas os pensamentos cheiram mal

(thadeu e edílson)


chegaram em treze no bar, às duas horas e trinta e três minutos,
(sei exatamente porque havia acabado de informar para ela
detalhe: o monstro ao seu lado estava de rolex)
cabelos em pé, coturnos, roupas em farrapos,
os caras chegam e tocam o foda-se
riem alto e pra valer
detalhe: um deles era quase o dobro da fera que estava com a bela
e é o que me reconhece
traz o resto da turma até minha mesa
e nem sei se nos apresentamos
mas eles gostam é de ser chamados de “os piá da véia”
pedem cerveja e vão ficando por ali
me fazem algumas perguntas sobre o marcos prado
falo de algumas canções
cantarolo alguns poemas
lembro-me bem, estávamos felizes e bem humorados
e a morena, ah, a morena
meus olhos eram os bíceps mais avantajados do bar
os dela, cada vez mais sorridentes,
os dele, iguaizinhos ao de satanás


a fúria da nossa mesa parece incomodar os que se retiram
duas mesas fecham a conta
duas câmeras em close uma em mim, outra nela
iluminação: tudo muito nítido, até demais
trilha: o movimento punk nunca há de morrer!
Uma voz profunda lá no fundo mas bem no fundo diz
“o que é que você tanto vê nela?”


mas essa cerveja, mas essas canções,
nos põe comovidos como o diabo


3,30 h E TUDO ESTÁ BEM!!

Os caras estão com pouca grana
E eu com seis garrafas quebradas no bolso
Não posso fazer mais nada para que fiquem
E assim como veio o movimento ia...mas

Aproveitando o vácuo
Um velhinho levanta-se
Abre uma pasta
Tira de dentro um palquinho e o põe sobre o balcão
Ajeita a iluminação
As caixinhas de som
Repete 3 vezes “number nine” ao microfone
Confere a afinação do pianinho
Deposita uma partitura sobre o suporte
E retira do bolso
Um ratinho de fraque
E uma borboleta vestindo um longo generosamente decotado
Coloca-o ao piano
E a ela entrega o microfone

Silêncio de acordar cemitérios
A platéia nem respira
O dono do bar sai e volta de óculos
Enquanto isso...
A morena tenta mostrar que tem seios mais atraentes
Eu? Bem ...vocês vão dizer que eu estava bêbado!

Quando os primeiros acordes soaram
Uma sagrada emoção toma o coração de todos
Mas é na primeira frase da melodia
Que a madrugada vira meio-dia

Não é um ser humano cantando,
Não não é, é um anjo
Sua voz seria a da sereia
Se não fosse paixão na veia

O grandalhão, que acompanha a morena,
Deixa cair o cigarro da boca
E tão logo termina o show
Sob aplausos que quase derrubam o bar
Pede pro velhinho pôr preço na dupla
“Ó, pra ser bem sincero co sinhô,
a dupla eu não vendo não
mas se interessar a vossa senhoria
posso passar na gaita a brabuleta”
disse e sorriu sem dentes
“E quanto é só a mariposa?”
“Digamos que o sinhô paga todas pra essa rapaziada”
“Faço melhor, aqui estão dois mil reais
o senhor mesmo paga”
Arranca a borboleta de suas mãos e sai voando
A feinha faz bonito e vai junto

Ninguém se conforma

Alguém diz – mas o senhor é muito trouxa
“sô não”
Outro – ela vale milhões
“vale não”
E mais um: o cara trapaceou
“trapiciou não”
E um último: esse véio tá necrosado
( acho que ele quis dizer esclerosado)
“tô não, a brabuleta não vale nada”

voltaram os trovões gritadores
- tem que internar um filho da puta desses
“o sinhô pode servir tudo do bão que eles quisé
eu quero vorta pra casa sem um tostão”
senta na nossa mesa
“ué mas cadê a festa?”
eu ainda arrisquei – o senhor vendeu bem baratinho!!
“vendi não”
14 vozes fizeram a mesma pergunta: como não?
“o ratinho é que é um tremendo de um ventríliqui”

A gargalhada que se segue
Bom... isso é com vocês


Só sei que unidos sob a tutela do bom velhinho

Tocamos juntos o foda-se
E nós, eu já me achava um da turma “os piá da véia”:

“Viva o véio! VIVA!!”
E pro véio nada, TUDO!!!
Então como é que é?!!

Acepipes e guloseimas parecem cair do céu
E quando vejo aquele anjo só
Fulmino: você vem sempre aqui?

Fim do Capítulo 3






Meu talentoso amigo Mário Bortolotto estréia hoje mais uma das suas peripécias.
Não vi mas já gostei. Espero todo mundo lá.







Novelha:
Os bêbados amam demais

Capítulo 2: A divina comédia



Por alguns poucos instantes nada se fez,
O gago falar sem gaguejar bateu fundo,
Como se o milagre fosse o fato da vez.
E nada mais interessasse nesse mundo.
O acontecimento de tão inusitado
Nocauteou a todos e tudo ficou parado.

Suspensos no ar, todos se olhavam, admirados,
Tempo que se não me falha a memória deu
Para ver se eu ainda estava com dois bagos
E conferir nos documentos se Thadeu
Era ainda meu nome e estava mesmo ali.
“Fi-fi-filho da puputa!” Súbito, ouvi.

O que se seguiu então foi o fim do milagre.
Ato contínuo, se voltaram contra mim,
Todos, sem exceção. Mas eu, mais liso que bagre
Besuntado: “Isso não vai ficar assim!”
Comecei a arrumar as cadeiras no lugar
E fui imitado pelo dono do bar.

“Ok, pessoal, acabou!” Olhou de cima em baixo
pra mim e disse “Você paga cinco casco!”
“Cinco cascos?” Retruquei. Ele: “Agora, seis!
E não se fala mais nisso! Bebam, vocês!
Chega de merda, se não eu fecho essa porra!”
Falou, como se estivesse com a cachorra.

E foi obedecido instantaneamente.
O gago me olhou como se quisesse mais,
Pegou um copo e virou para um cara em frente,
Que me analisava e ignorava os demais.
Revidei com meu olhar exterminador,
Que o atravessou e foi parar no agressor.

A cara do lazarento já dizia tudo:
Estava para o crime, o filho da puta.
Pedi mais duas e uma vodka com limão e gelo.
Acendi um cigarro e baforei, resoluto.
Nisso, cheguei a pensar no fim da disputa,
Pois todo mundo tem amor ao próprio pêlo.

A música recomeçou e junto os papos
Animados retomaram conta das mesas.
Tranqüilizei-me e passei a saborear
A vodka, a cerveja, lembrando dos sopapos,
Do esporro e também da troca de gentilezas.
Ri, levantei, olhei em volta e fui mijar.

Coisa boa, ah!, esse é um prazer inenarrável.
No mundo dos homens, mijar é religião.
Nessa hora o bebum não tem Deus, tem um pau,
O altar é o vaso e a reza, um jorrão.
Sacudi com amor para que nenhum pingo
Molhasse minha cueca branca, que estava um brinco.

Saio do reservado gostando mais da vida.
Quando dou de cara com duas caras de poucos
Amigos. O gago e o que me armou pra briga.
Olhamo-nos feio e só. As marcas dos socos
Eram visíveis a olho nu. Saí a salvo
Do banheiro, achando positivo o saldo.

Já estava me imaginando estar com tudo,
Quando entra no bar uma morena daquelas
Que deixa qualquer homem sem rumo e sem nada.
Acompanhada de uma feinha e um peludo,
Calvo, forte e musculoso como um gorila.
No peito, sobre os pêlos, a corrente brilha.

A morenaça senta, cruza as pernas, vira-se
Pra mim e pergunta: “Tem fogo, bonitão?”
Isso me incendiou o corpo e a alma e, diga-se
A verdade, o ego virou cauda de pavão.
Solícito como um bom garçom, acendi-lhe
A tão famosa cigarrilha Picadilly.

O olhar de agradecimento que ela meu deu
Não passou em branco pelo seu acompanhante,
Que sorriu, avisando que aquilo era seu.
Entendi perfeitamente e, dali em diante,
A coisa tomou rumos que nem eu nem Dante
Ousaria imaginar entre o inferno e o céu.

Fim do capítulo 2





terça-feira, novembro 21, 2006








Polaco da Barreirinha entra com os dois pés no peito da era das novelhas.
Em 10 capítulos, você vai saber como é que tudo pode acontecer, quando se exagera nos aperitivos e, ainda, toma, pelos menos, umas quinze saideiras.


Novelha

Os Bêbados Amam Demais


Dia desses, andando no cu da madrugada,
Tão bêbado, trôpego, triste e comovido,
Que imaginei estar sofrendo na carcaça
Todas as dores desse mundo sem sentido.

O céu ía alto. Na rua, um asfalto de merda
Ampliava os riscos de eu me esborrachar no chão,
Mas, na hora, sem saber de nada disso, achei certa
A decisão de ir em frente e, quer queira ou não,

Com bêbado não se discute, ainda mais quando
Ele é você mesmo. Assim, nós, ou melhor, eu,
Saí a procurar um bar aberto e, fumando,
Já nem me lembrava do que me aborreceu.

O bairro Barreirinha é grande e escuro.
Tateando, investigando, perscrutando, achei.
No fundo do quintal, o barraco, sem muro,
Era simples e aconchegante. Nem pensei.

Pedi logo duas, pra não ter que esperar
Trazerem outra quando a primeira acabar.
Sentado, bebendo e fumando, não vi a hora
Passar. É engraçado ver isso tudo agora!

Eu, na maior deprê, sem ter pra onde ir,
Me julgando o borrabosta mor da cidade,
Estava ali tranqüilo, tomando uma beer,
Queimando um Marlboro em total felicidade.

Mas se uma tempestade não dura pra sempre;
A paz também já nasce com o umbigo roxo.
Na mesa ao lado, um beberrão, completamente
Louco, ergue-se e me acerta, em cheio, um soco.

Doeu mais a ofensa que o direto, porém,
Enfiei-lhe a mão na cara, sem perdão nenhum.
O dono do bar entrou na briga, também,
E o bafafá virou um borobodó...hummm!

Meu Deus! Todo mundo dando porrada, bem
Pra caralho. Até um gaguinho, meio picego,
Entrou na dança, veio pra cima de mim sem
A menor cerimônia e foi como um prego.

Deu dó, foi um tombo só. Dei-lhe uma rasteira,
Que foi linda de ver! Horizontalizei
No ar o filho da puta , que caiu, sem eira
Nem beira, gritando “levitei, levitei!”


Fim do Capítulo 1.

Amanhã, você vai saber o que acontece quando todo mundo se vira contra você,
mesmo quando é inocente. O Polaco da Barreirinha sairá vivo dessa?
O que mais pode acontecer numa noite só?

Tcham, tcham, tchammmmmmmm!



segunda-feira, novembro 20, 2006

Imagem:ADN animation.gif - Wikipédia

Imagem:ADN animation.gif - Wikipédia





DNA


Sou um poeta! Escravo do que escrevo,
Réu do que silencio; senhor, apenas,
De míseras quimeras, às quais devo
Minha vida, minha obra a duras penas.

Não que não me divirta com o esmero
Dos mestres que vieram antes. Dezenas
Deles deram a mim e ao meu selo
A forma, a fôrma, a fórmula, os fonemas.

A eles consagro esse augusto farol
Que me guia, orienta e me põe a salvo,
Não das tormentas, mas da calmaria,

Para que meu pobre coração vol-
Te das trevas e - sol - tome de assalto
A vida que eu pedi a Deus um dia!

Antonio Thadeu Wojciechowski



sábado, novembro 18, 2006


O Solda pediu pra dar este recado. Quem sou eu pra desobedecer?
Aliás, estarei lá pra fazer a festa.






Novo Passado

Quanto tempo! Meu Deus! Parece que foi ontem!
Você de mim ausente; eu, de você
Só lembrança, à mercê do que me contem.
Mas nada a lamentar ou pra entender.

O passado feliz é como um totem.
Abrem-se sons, visões e, pode crer,
Viajar no tempo vai de um horizonte
A outro eqüidistante, onde se vê

O vivido com outros olhos. Outros
Pensamentos, entre outros sonhos, entre
Você e eu e tantos outros, que nos viam

E nem imaginavam, nesses encontros,
Que a vida pode vir, mas ir em frente,
Como pedras rolantes, de Bob Dylan!

Antonio Thadeu Wojciechowski





terça-feira, novembro 14, 2006





O outro lado da minha noite


Do outro lado do poema tem um verso
Avesso ao que converso
Com ele eu cumprimento
Com ele eu me despeço

Pra você que se inclui fora dessa
Ouça esse silêncio que não cessa


Édson de Vulcanis e Thadeu W



Abúlicos também amam

Beber no bar é alucinação coletiva,
Terapia de grupo em trânsito de doido.
Sofrer entre amigos custa mais e não dói,
A lágrima corre menos que a bebida,
Mas antes gargalhos sobem pelos gargalos.
Cada um sabe de si aonde apertam os calos,

Ninguém está a salvo do vexame total:
Cair de quatro após pendurar a conta.
Divergir de alguém na euforia sempre é fatal,
Pro bar um prejuízo certo de grande monta.
Depois da décima segunda saideira,
Podemos ficar aqui, juntos, a vida inteira!


Édson de Vulcanis e Thadeu W








Ainda é tempo?

Nem uma vida inteira de desculpas
Vai dar graça à tua face, minha cara.
Teus pecados mortais, as mil culpas,
Que te afligem agora, a dor não sara.

Tua beleza se foi, vieram as pústulas
Do tempo e contra elas nada salva,
Nada pode. A dívida são multas
Que a vida cobra à tapa na tua cara.

Cinqüenta anos passaram e não viste
Nada, que não fosse o espelho em tua frente.
E se a imagem que vês hoje te fere,

É porque tua alma, de dedo em riste,
Vê em ti, apenas a sombra indiferente
A tudo que ela amou e sentiu na pele!

Antonio Thadeu Wojciechowski



segunda-feira, novembro 13, 2006





POESIA:



"words set to music"(Dante
via Pound), "uma viagem ao
desconhecido" (Maiakóvski), "cernes
e medulas" (Ezra Pound), "a fala do
infalável" (Goethe), "linguagem
voltada para a sua própria
materialidade" (Jakobson),
"permanente hesitação entre som e
sentido" (Paul Valery), "fundação do
ser mediante a palavra" (Heidegger),
"a religião original da humanidade"
(Novalis), "as melhores palavras na
melhor ordem" (Coleridge), "emoção
relembrada na tranqüilidade"
(Wordsworth), "ciência e paixão"
(Alfred de Vigny), "se faz com
palavras, não com idéias" (Mallarmé),
"música que se faz com
idéias" (Ricardo Reis/Fernando Pessoa),
"um fingimento deveras" (Fernando
Pessoa), "criticismo of life" (Mathew
Arnold), "palavra-coisa" (Sartre),
"linguagem em estado de pureza
selvagem" (Octavio Paz), "poetry is to
inspire" (Bob Dylan), "design de
linguagem" (Décio Pignatari), "lo
impossible hecho possible" (Garcia
Lorca), "aquilo que se perde na
tradução (Robert Frost), "a liberdade
da minha linguagem" (Paulo Leminski),
Gol – o resto é prosa (Thadeu W e Roberto Prado).


Definições reunidas por Paulo Leminski.

sexta-feira, novembro 10, 2006

Todo mundo lá!

quinta-feira, novembro 09, 2006




K2


do alto da montanha mais alta
avistam-se inescaláveis horizontes
tudo aquilo que ao homem falta
abre-se como bênçãos aos montes

o corpo, como a montanha, cai,
cede aos desmandos do tempo,
contudo, esse espírito que dele sai
vai falar maravilhas desse momento

e se Deus, do alto de suas alturas,
quisesse ao altissimo k2 descer,
creio que até as almas mais impuras,
subiriam para não vê-lo padecer

tão bela seria a sua visão da Terra
que por certo encontraria quem erra,
ferindo o corpo nas escarpas da carne,
para recriá-lo em luz, beleza e charme

Thadeu W e Plínio Gonzaga






Brasil em ação

Enquanto o governo capa pitbull por decreto
O povo mata cachorro magro a grito
2 milhões de desempregados sarnentos só em são paulo é bonito?
280 milhões no bolso do juiz ladrão
dão coceira na mão de coronel nordestino, poderoso chefão,
que pede cadeia pra quem rouba mal e atrasa comissão
cocaína e ministros malacos aterrisam de nariz nos aviões de carreira da FAB
90 assassinatos por dia pelo Brasil, sem contar os bêbados volantes
e as tentativas do compadre, brandindo a comadre nos corredores do SUS
Ponto facultativo para funcionários públicos do Piauí no dia do fim do mundo
Jesus foi expulso mais cedo do templo pelo bispo vendilhão

Miséria pouca é bobagem demais
Você nunca viu o povo mais magro
Você foi tão longe que tanto faz
Você cansou de fazer hora coçando o saco

O Brasil do futuro é a implosão de agora
Só vai sobrar eu, você e o povão da última hora

Thadeu W e Roberto Prado




dessa palavra
que me escapa
tiro o escalpo

deus me acuda!

o vocábulo calvo
já não leva
a idéia cabeluda


Thadeu W e Roberto Prado




Até aprender

Quem nunca cantou o amor
Se desencantou
Quem nunca colheu uma flor
Não desabrochou
Se não sentiu dor no peito
Frio na barriga
Se não ficou sem jeito
Nem comprou briga
Quem nunca perdeu a razão
Não tem coração
Vai ter que viver
Até aprender

(Thadeu W e Edílson G)



quarta-feira, novembro 08, 2006






Jurado de Morte


Os nervos em frangalhos, o olho vesgo,
A sensibilidade à flor da pele,
Essa respiração que nem ar expele
Direito, a sensação de ser o mesmo
Ser desumano, hipócrita, egoísta,
Que deve a conta que pagou à vista.

De onde vem essa dor?, eu me pergunto
E a resposta remói o passado próximo,
Como um fantasma, mal que chega junto
E ganha forma e sempre assombra, sólido.
É o remorso, esse tribunal patético,
Que em penas capitais, pune, enérgico,

Rico e pobre, sábio e ignorante,
Todos, sem distinção de cor ou credo.
Pra muitos, a experiência é edificante;
Para mim, uma porta para o inferno.
E se hoje volto assim, co’a alma alegre,
É que já não há diabo que a carregue!

Antonio Thadeu Wojciechowski





terça-feira, novembro 07, 2006





Imaginem se eu tivesse infância


não me venha cobrar pela agressão gratuita
ensinar que é bom, ninguém ensina
depois ficam falando por trás das minhas gracinhas
paródias, deboches, escárnios, sem o menor respeito
entendam de uma vez que esse é o meu jeito

nunca tive dinheiro para comprar um livro
os que roubei eram de um mau gosto incrível
todos diziam que eu não valia o sermão que ouvia
dicas, palpites, orientações, exemplos sadios
meus amigos eram todos uns vadios

saber ler e escrever pra mim já é muito
os bons se acham demais pra perder tempo comigo
pra chegar onde cheguei só eu sei o que engraxei
disso ninguém lembra na hora de exigir qualidade
meu escrito e escarrado é o retrato dessa realidade

subnutrido não aprende nada na escola
a dureza da vida foi minha tese de pós-graduação
quem não teve sapato pra jogar tem que entrar de sola
repetidor, inculto, kitsh, demodê, estilo indefinido
o que vocês tiram dos livros, eu tiro do ouvido

eu guardei na pele toda sorte de humilhações
hoje, quando me querem no picadeiro de letrados
vejo que eu estava até certo ponto errado
abraços, beijos, elogios: dêem pro coitado do porteiro
minha parte da glória eu quero em dinheiro

Antonio Thadeu Wojciechowski e Roberto Prado



quarta-feira, novembro 01, 2006



Dia de Finados


Um belo dia, o Bashô, poeta japonês, pai do haicai, vendo a multidão que ía pelos campos colhendo flores para homenagear os mortos no dia de finados, escreveu:


dia de finados
do jeito que estão
dedico as flores


O pequeno poema fez muita gente mudar, abandonar tradição e começar a apenas admirar a beleza das flores durante o trajeto e dedicar esse momento de comunhão com a natureza aos seus entes queridos mortos.



Olhos para a chuva

Choveu a noite toda como nunca
E eu fiquei mais feliz. Gosto da chuva,
Intermitente, oblíqua, que tudo junta
E alimenta o alface, o lírio e a uva.

Também os mortos levam uma ducha
E matam a imortal sede, que é muita,
Mesmo no frio da última espelunca.
Ainda bem, toda flor algum dia murcha,

E o que era esplendor, beleza e luz,
Rapidamente some e se soma ao húmus,
Que vai alimentar milhões de bocas.

Agora não são poucas essas gotas,
Que caem como dádivas da vida,
Com toda emoção da missão cumprida!


Antonio Thadeu Wojciechowski